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PorFraternidade Rosacruz de Campinas

Goethe e Sua Contribuição à Humanidade

Goethe[1] é considerado um dos luminares da inteligência humana. Tal foi a amplitude do seu cabedal de conhecimentos, admirável a profundidade do seu pensamento, que constitui tarefa complexa traçar sua biografia. Os traços biográficos de um homem dessa Natureza não podem cingir-se meramente à indicação de sua origem, de seus passos, de sua morte, ao relato de suas imortais obras e ao alcance de seus conceitos mais divulgados. Tornar-se-ia necessário viver suas próprias experiências, beber da fonte da sabedoria da qual ele extraiu as mais belas joias do pensamento humano.

Suas obras, analisadas literalmente, evidenciam sua genialidade. Perscrutadas nas entrelinhas, à luz do espírito, descortinam um verdadeiro universo de conhecimentos ocultos, próprios de um Iniciado. E ele era. Em “Fausto”, por exemplo, encontramos algumas das leis básicas da evolução. Quando Lúcifer pede a Fausto que assine o pacto estabelecido entre ambos com “uma gota de sangue”, surge uma dessas evidências.

Constitui um trabalho fascinante descobrir as várias facetas desse grande espírito. Vamos a algumas delas.

É nesta altura que nos são abertas, pelas ideias de Goethe, perspectivas completamente novas. Goethe não era apenas o grande poeta lírico e dramático, autor do ‘Werther’[2], ‘Iphigenie’[3] e ‘Fausto[4], mas um cientista e filósofo tão profundo e original que ele mesmo considerava sua obra científica superior à sua obra poética. Várias descobertas lhe asseguram um lugar de destaque na história das ciências.

Mas não é como cientista ‘de métier’ que Goethe nos interessa aqui. Tampouco valeria a pena determo-nos demoradamente em suas ideias, se fossem apenas opiniões ou teorias divergentes, em certos detalhes, das de seus predecessores e contemporâneos. Goethe representa muito mais do que isso: sua cosmovisão é uma alternativa, totalmente diferente, para toda maneira de ser e de pensar dos séculos XIX ao XXI. Para quem acompanha, com preocupação cada vez maior, o enfoque da vida e a escala de valores adotados pela humanidade sob a influência do materialismo científico e do pragmatismo utilitarista, o “goetheanismo” constitui uma opção que só não tem merecido atenção maior porque certos conceitos são tão arraigados no ser humano de hoje que ele simplesmente não pode imaginar uma maneira diferente de pensar e de julgar.”

Por esse motivo, analisaremos mais profundamente o “goetheanismo”, sem nos preocuparmos com o que possa ter de inusitado e esdrúxulo para pessoas acostumadas a raciocinar exclusivamente dentro dos moldes e conforme os modelos atualmente aceitos. As ciências têm evoluído por um caminho oposto a Goethe, e o mundo moderno é um fruto dessa evolução.

Para Goethe, as ciências têm a função de explicar ao ser humano os fenômenos com que esse se defronta ao abordar a Natureza. Nesse ponto, Goethe não diverge dos grandes pioneiros das ciências. Mas, o que significa ‘explicar’? Para Goethe, ‘explicar’ um fato novo e desconhecido significa reduzi-lo, dentro da mesma esfera de observação, a outros fenômenos mais simples, até mostrar que ele se integra no contexto do mundo fenomenal restante, sem que haja divergência entre o fato e as ideias subjacentes a esse mundo. Dentro de cada área há fatos tão simples que não podem ser reduzidos a outros ainda mais simples: são evidentes em si. Goethe os chama de ‘fenômenos primordiais’ (‘Urphônomen’).

Nossa curiosidade científica é satisfeita quando conseguimos explicar um fato pelos ‘fenômenos primordiais’ subjacentes. Tais fenômenos primordiais existem em todas as áreas da Região Química do Mundo Físico: na mecânica, na ótica, na termologia, no magnetismo… A explicação científica deve, portanto, descobrir, dentro da mesma área, os fenômenos primordiais que fazem parte do fenômeno indagado. Não se acrescenta coisa alguma a uma explicação quando se procura encontrar uma ‘causa’ situada em outra área. Explicar o fenômeno ótico por uma ‘causa mecânica’, por exemplo, seria não só inadequado, mas contrário à própria função da ciência. Essa atitude seria totalmente ilícita, se a ‘causa’ invocada fosse algo hipotético como, por exemplo, a aceitação hipotética de ‘ondas’ de luz para explicar certos fenômenos óticos.

O cientista deve sempre ficar dentro do âmbito dos fenômenos, e não pode procurar causas teóricas situadas além desse âmbito. Os fenômenos primordiais podem ser enunciados sob forma de ‘Leis da Natureza’, e sua formulação pode conter elementos matemáticos, desde que o aspecto matemático-quantitativo faça parte desse fenômeno. O que não é permitido é reduzir fenômenos qualitativos a estruturas meramente quantitativas e recorrer a leis mecânicas, matematicamente formuladas, para ‘explicar’ um fenômeno. ‘Explicar’ o fenômeno ‘calor’ pelo movimento browniano das moléculas não significa nada, para Goethe. O fenômeno ‘calor’, que existe na percepção de um ser sensível, paralelamente pode ter, na área do universo molecular, um efeito como o movimento browniano, mas não se acrescenta algo à explicação do fenômeno invocado como sua ‘causa’ o referido movimento, ou pior ainda, afirmando que a ‘realidade objetiva’ do fato se verifica no nível do mundo molecular.

A Natureza nos fala, portanto, por meio de linguagens próprias a cada área. Reduzindo os fenômenos observados, dentro de uma área, a ‘causas’ existentes em outras, é procurar obter uma resposta em uma linguagem imprópria. A resposta perde o seu sentido quando formulada em uma linguagem estranha. Ora, quando se dá uma explicação mecanicista e quantificada para um fenômeno que o organismo sensorial do ser humano vivencia como qualitativo, a linguagem da resposta é imprópria. Por esse motivo, a atitude de Descartes[5] de admitir em um objeto apenas as qualidades ‘primárias’, as qualidades secundárias, implica uma abstração ilícita; pois o objeto não é captado em sua realidade, já que tamanho e movimento não podem ser considerados independentemente do resto. Igualmente, o tamanho e as demais qualidades ‘objetivas’ são revelados por nossos sentidos, ou por aparelhos que os substituem.

Convém fazer, nesta altura, uma ressalva. O “goetheanismo” não significa, de modo algum, que o ser humano deixe de raciocinar; significa apenas a negação de um raciocínio unilateralmente matemático e mecanicista, em áreas onde só um pensar mais amplo é capaz de captar toda a realidade. Não é correto que as verdades matemáticas sejam mais simples ou de compreensão mais fácil do que as outras.

Goethe realça, de certo modo, as qualidades ‘secundárias’, porque são elas que afetam, de forma mais intensa, o maravilhoso organismo sensorial do ser humano, que o cartesianismo tacha desdenhosamente de subjetivo.

Nunca devemos esquecer que é o ser humano (o Ego humano, que é um Espírito Virginal da Onda de Vida humana manifestado aqui) que se encontra, com suas perguntas, diante da Natureza e é como ser humano que deve receber as respostas; e deve recebê-las de forma humana. A inobservância desse princípio básico é a causa da alienação do ser humano em relação às ciências e da alienação das ciências em relação à realidade.

Ao enfrentar um fenômeno da Natureza, o ser humano o faz como ser total (um Tríplice Espírito que trabalha em um Tríplice Corpo e uma Mente, todos veículos construídos por ele mesmo em cada vida que ele vive aqui); ele tem diante de si o fenômeno como algo total. Se o raciocínio abstrato for a única função do observador, e se as únicas qualidades captadas do objeto forem as acessíveis a esse pensar mecânico-matemático, a relação do ser humano-objeto nunca poderá ser completa; será restrita e, portanto, falsa. Para que a pergunta — que sempre envolve o ser humano total — possa ser satisfatoriamente respondida, deve haver uma comunhão total entre ele e a Natureza. Goethe afirma que tal comunhão intuitiva — chama-a também de juízo contemplativo — é possível porque o próprio ser humano emana da Natureza e continua a fazer parte dela. O ser humano contém a Natureza; foi ela que plasmou seus órgãos sensoriais — existe, pois, uma afinidade intrínseca entre o seu ser e o ser da Natureza. O olho não apareceu no ser humano ‘por acaso’, permitindo-lhe, depois, enxergar a luz; foi ela que plasmou o olho (afinal, a luz preexistente criou o olho que a pudesse ver, ou ainda, a Natureza construiu os olhos para receberam a luz, em resposta à função já existente, lá na Época Atlante). Existe, portanto, uma afinidade básica, essencial, entre o órgão da visão e o Mundo visível; isto é, iluminado pela luz. A cognição do mundo pressupõe uma correspondência íntima entre o modo de ser da Natureza e o modo de conhecer do observador; de outro lado, essa correspondência é suficiente para se ter a verdadeira contemplação ou intuição, que permite vislumbrar na ‘realidade’ a ideia do que nela se ‘realiza’.

Em sua ‘Teoria das Cores’[6], Goethe dirigiu uma forte crítica a Newton. Não poderemos julgar equitativamente essa polêmica se não tivermos em mente que a maneira de ambos abordarem a Natureza é totalmente diversa. Não há medida comum possível; eles falam, de certa forma, línguas diferentes.

Compreendemos a Natureza nos compenetrando por meio de uma investigação intuitiva junto às leis intrínsecas de cada um dos seus reinos e setores. Captar essas ideias não significa viver uma atitude de misticismo sonhador, mas, sim, de penetrar até os últimos segredos da Natureza.

Em cada setor ou reino, essas ideias se realizam através de graus de intensidade que a vivência íntima do observador permite captar. A Natureza brinca, de certo modo, com formas primordiais, e produz a multiplicidade das suas formas visíveis por meio de uma atividade criadora, que é afim com o impulso criador do artista. E assim como mergulhamos dentro de uma obra de arte sem dissecá-la, identificamo-nos também com a essência dessas formas através de uma atitude de contemplação ativa; ou seja, uma identificação que é, ao mesmo tempo, inteligente e intuitiva, e que nos faz chegar às ideias mestras que se expressam em um fenômeno da Natureza; isso é o que Goethe chama de ser realista e objetivo.

As ideias ativas dentro da Natureza se realizam segundo os princípios da polaridade e da intensificação. Cada ideia produz, em dado momento, uma multiplicidade dentro da unidade. Sem ter a rigidez formal da dialética hegeliana[7], esse princípio da polaridade explica a diversidade das formas. Além disso, cada força pode atuar com um maior ou menor grau de intensidade. Esses dois princípios — o da polaridade acoplado ao da intensidade (‘Polaritât und Steigerung’) — produzem uma quase ilimitada riqueza de formas e fenômenos. São energias intrínsecas que o observador pode e deve vivenciar como tais. Se ele quer analisar um fenômeno, aplicando-lhe um critério exterior — em outras palavras, se o ‘mede’ com um metro proveniente de outro setor (medir é comparar uma grandeza com um ‘metro’ que não lhe é estranho) — ele não capta a realidade intrínseca, mas apenas aquelas qualidades que o fenômeno possa ter em comum com o setor do qual foi tirado o metro.

Também no campo da Natureza orgânica existem formas básicas, que podem servir de critério para a compreensão de qualquer forma particular. Goethe os chama de ‘tipos’, e todas as suas concepções botânicas e zoológicas têm por objetivo a metamorfose desses tipos básicos, que causa a diversidade das formas e fenômenos concretos. Segundo ele, os fenômenos da vida só podem ser compreendidos dessa forma, e nunca por uma análise químico-física que usa exclusivamente parâmetros da Natureza inorgânica. O cientista age também incorretamente quando transpõe os critérios de ‘um’ setor da Natureza inorgânica para a ‘explicação’ de um fenômeno observado em outro setor, também da Natureza inorgânica.

Segundo Goethe, o objetivo das ciências não é a “dissolução” de um fenômeno em uma fórmula (com a perda de todas as suas características individuais), mas sua integração no resto dos fenômenos da mesma área.

Cabe aqui, mais uma vez, uma observação a respeito do uso da matemática nas ciências. Leibniz[8] tinha afirmado que uma ciência é ciência só na medida em que contém matemática. Goethe diverge fundamentalmente dessa opinião — embora negue peremptoriamente ser um inimigo da matemática. Ele lhe reconhece os grandes méritos, dentro de uma determinada área: o objetivo da matemática são as grandezas; ora, há muita coisa no mundo que não é grandeza, ou que é mais do que simples grandeza.

Igualmente, a matemática abrange princípios formais que não são meras ‘grandezas’. Encontramos também em Goethe um profundo respeito perante esse tipo de matemática, que se aproxima do pitagorismo[9].

Sem estar ligado a qualquer dogma, Goethe era um homem profundamente religioso. Para ele, a Natureza é obra divina, e revela a existência e a atuação de forças divinas.


[1] N.R.: Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) foi um polímata, autor e estadista alemão do Sacro Império Romano-Germânico que também fez incursões pelo campo da ciência natural. Como escritor, Goethe foi uma das mais importantes figuras da literatura alemã e do Romantismo europeu, nos finais do século XVIII e inícios do século XIX.

[2] N.R.: Iphigenia in Tauris (alemão: Iphigenie auf Tauris) é uma reformulação de Johann Wolfgang von Goethe da antiga tragédia grega Iphigeneia en Taurois de Eurípides. O título de Eurípides significa “Iphigenia entre os taurinos”, enquanto o título de Goethe significa “Iphigenia in Taurica”, o país dos tauri.  Aqui um resumo da obra: Os sofrimentos do jovem Werther ou no original em língua alemã Die Leiden des jungen Werthers (1774) é um romance de Johann Wolfgang von Goethe. Marco inicial do romantismo, considerado por muitos como uma obra-prima da literatura mundial, é uma das primeiras obras do autor, de tom autobiográfico — ainda que Goethe tenha cuidado para que nomes e lugares fossem trocados e, naturalmente, algumas partes fictícias acrescentadas, como o final. Neste livro, o suposto Werther envia, por um longo período, cartas ao narrador, que, em notas de rodapé, afirma que nomes e lugares foram trocados. O romance é escrito em primeira pessoa e com poucas personagens. Após a sua primeira publicação, em 1774, teria ocorrido, na Europa, uma onda de suicídios, atribuída à influência do personagem de Goethe, que foi chamada “efeito Werther”. No entanto, esse impacto do romance sobre o número de suicídios nunca foi demonstrado. Apenas mais recentemente foram realizadas tentativas científicas de examinar a existência desse possível efeito de Werther.

[3] N.R.: Amado pelos deuses por sua sabedoria, o semideus Tântalo uma vez foi convidado para sua comunhão. Tornando-se turbulento enquanto celebrava com eles, ele começou a se gabar e roubou o néctar e a ambrosia dos deuses, seu alimento de imortalidade. Quando os deuses vieram ver Tântalo, por sua vez, ele testou sua onisciência oferecendo seu próprio filho Pélope a eles como refeição. Ofendido pelo engano, os deuses baniram Tântalo de sua comunidade para o Tártaro e amaldiçoaram ele e sua família, a Casa de Atreus. Isso ficou conhecido como a maldição dos tântalo, na qual os descendentes de Tântalo em todas as gerações subsequentes foram levados por vingança e ódio ao assassinato de seus próprios familiares. Assim Agamenon, comandante do exército e bisneto de Tântalo, ofereceu sua filha mais velha Ifigênia à deusa Diana (em grego conhecida como Ártemis) para garantir ventos favoráveis ​​para a viagem de Áulis, moderna Avlida, a Tróia, onde pretendia travar a guerra. contra Tróia. Na crença equivocada de que seu marido Agamenon havia assassinado sua filha Ifigênia, Clitemnestra então matou Agamenon após seu retorno da Guerra de Tróia. Como resultado, Orestes e Electra, irmão e irmã de Ifigênia, guardaram rancor contra a mãe pelo assassinato de seu pai, e Orestes, com a ajuda de Electra, assassinou sua mãe Clitemnestra. Sendo agora culpado de um assassinato, ele também caiu sob a maldição da família. Em uma tentativa de fugir de seu destino iminente de ser vítima de vingança e de ser morto por seu crime, ele fugiu. Consultando o Oráculo de Delfos de Apolo, ele foi instruído a trazer “a irmã” para Atenas e que essa seria a única maneira de acabar com a maldição. Como supunha que sua irmã Ifigênia já estava morta, Orestes supôs que o oráculo devia significar a irmã gêmea de Apolo, a deusa Diana. Ele, portanto, planejou roubar a estátua de Diana do templo em Tauris e partiu com seu velho amigo Pílades para a costa de Tauris.

[4] N.R.: Fausto (em alemão: Faust) é um poema trágico do escritor alemão Johann Wolfgang von Goethe, dividido em duas partes. Está redigido como uma peça de teatro com diálogos rimados, pensado mais para ser lido que para ser encenado. É considerado uma das grandes obras-primas da literatura alemã. A criação da obra ocupou toda a vida de Goethe, ainda que não de maneira contínua. A primeira versão foi composta em 1775, mas era apenas um esboço conhecido como Urfaust (Proto-Fausto). Outro esboço foi feito em 1791, intitulado Faust, ein Fragment (Fausto, um fragmento) e, também, não chegou a ser publicado. A versão definitiva só seria escrita e publicada por Goethe no ano de 1808, sob o título Faust, eine Tragödie (Fausto, uma tragédia). A problemática humana expressada no Fausto foi retomada a partir de 1826, quando ele começou a escrever uma segunda parte. Esta foi publicada postumamente sob o título de Faust. Der Tragödie zweiter Teil in fünf Akten (Fausto. Segunda parte da tragédia, em cinco atos) em 1832.

[5] N.R.: René Descartes (1596-1650) foi um filósofo, físico e matemático francês.

[6] N.R.: Teoria das Cores é um livro do alemão Johann Wolfgang von Goethe publicado em 1810. Contém uma descrição do fenômeno das cores que veio influenciar fortemente os artistas pré-rafaelistas.

[7] N.R.: O pensamento filosófico de Hegel é um sistema complexo de unidades no qual a mesma estrutura processa-se em áreas diferentes do conhecimento. Hegel, como um grande filósofo sistemático, aplica as mesmas categorias aos mais variados problemas. Sua dialética tríade domina sua forma de apresentar e superar os mesmos.

[8] N.R.: Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) foi um proeminente polímata e filósofo alemão e figura central na história da matemática e na história da filosofia. Sua realização mais notável foi conceber as ideias de cálculo diferencial e integral, independentemente dos desenvolvimentos contemporâneos de Isaac Newton

[9] N.R.: A Escola Pitagórica, fundada por Pitágoras, foi uma influente corrente da filosofia grega à qual pertenciam alguns dos mais antigos filósofos pré-socráticos. Os pitagóricos foram muito importantes no desenvolvimento da matemática grega. A própria palavra “matemática” surgiu com os pitagóricos (mathematikós, em grego), com a concepção de um sistema de pensamento em bases dedutíveis, e deles advêm o conhecido aforisma de que “a matemática é o alfabeto com o qual os deuses escreveram o universo”. Até então, a geometria e a aritmética tinham um caráter utilitário, intuitivo, fulcrado em problemas práticos, sendo fruto dos pitagóricos a classificação dos números em pares, ímpares, primos e racionais (estes são todos os números que podem ser representados na forma de fração). Também dos pitagóricos advêm estudos sistematizados de alguns poliedros e polígonos regulares, sobre proporções, números decimais e a seção áurea ou divina. A sua vez, a matemática influenciou sua posição filosófica concebendo que os números são os princípios de todas as coisas.

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz de abril/1977-Fraternidade Rosacruz-SP)

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A Arte — Expressão Criadora do Ser Humano

Que é o ser humano mortal para que te lembres dele? E o filho do ser humano para que o visites? Contudo, pouco menor o fizeste do que os Anjos, e de glória e de honra o coroaste.” (Sl 8:4)

A arte, conforme permite sua habilidade, segue a natureza como um aluno segue o seu Mestre. De modo que a arte deve ser, por assim dizer, algo que deriva de Deus.[1] (Dante)

Todas as atividades do ser humano podem ser divididas em três categorias, a saber: Ciência, Religião e Arte. A mais alta consecução do ser humano é conseguir florescê-las. Na escala da evolução o ser humano está situado entre a Onda de Vida dos Anjos e a Onda de Vida dos animais. Deus fez o ser humano “um pouco menor que os Anjos” e lhe concedeu o domínio sobre o Reino animal. Considerando a existência desses três fatores, Ciência, Religião e Arte, podemos compreender a diferença principal existente entre o ser humano e o animal. Nem a Ciência nem a Arte são necessárias para os animais, na presente fase do desenvolvimento deles.

No presente, a Ciência, com suas descobertas, assumiu posição destacada. A Religião também está despertando. Porém, aqui desejamos considerar as Artes. Não nos é possível traçar linhas claras de demarcação ao classificar as atividades do ser humano dessa maneira, porque a Ciência ajuda a compreender a Arte. E a Arte segue de mãos dadas com a Religião, quando trata de revelar a divindade do nosso ser. Max Heindel chama a Ciência, a Arte e a Religião de “uma trindade na unidade”. Sabemos que a separação em classificações diferentes é temporária. Num estado posterior do nosso desenvolvimento, as três tornarão a ser “um”

A verdadeira Religião inclui tanto a Arte como a Ciência, pois ensina uma vida formosa em harmonia com as leis da natureza.

A verdadeira Ciência é artística e religiosa no sentido mais amplo, porque nos ensina a reverenciar as leis que governam nosso bem-estar e a nos conformar com essas leis, explicando, além disso, por que a vida religiosa conduz à saúde e à beleza.

A verdadeira Arte é tão educacional como a Ciência e tão edificante como a Religião. Na arquitetura temos uma sublime apresentação de linhas cósmicas de força no universo.

Para muitos a vida sem a Arte verdadeira seria intolerável, porque a imaginação do ser humano requer alimento assim como o corpo necessita de nutrição. E é “imaginando” que se nutrem as almas. Existem três elementos necessários, quando se considera a Arte real: a música, a pintura, a poesia e a arquitetura. Esses três elementos indispensáveis são: emoção, expressão e ritmo.

A Arte pode ter por objeto a apresentação da forma exterior ou pode mostrar o espírito interno de um objeto; porém sempre é possuída por um crescente impulso emocional.

Para o artista dedicado é possível interpretar as realidades profundamente ocultas da natureza interna do ser humano. Essa revelação do espírito do ser humano é a sua mais elevada missão. Cada época produz escultores, pintores e músicos capazes de produzir verdades criadoras ao contemplar as obras de Deus. Porém, sempre essas criações contêm a concepção própria e individual do ser humano e a sua própria interpretação, posto que conservam sua “maneira de refletir a natureza”. Essa concepção individual do universo de Deus é o que promove as diferenças existentes no mundo da arte criadora. Sem dúvida, há somente uns poucos em cada época que podem pretender expressar uma originalidade verdadeira. Em geral o artista copia e recopia, sem ser capaz de revelar sua própria concepção individual do tema ou objeto.

Quando um artista se torna verdadeiramente criador, é capaz de influenciar a vida de uma nação inteira. O rumo que um povo segue delineia-se, em primeiro lugar, no trabalho e na expressão daqueles que têm sentimentos fortes, internos, e que são sensíveis aos impulsos ocultos do ser humano. Eles devem refletir as impressões que são capazes de receber para que os demais também se beneficiem delas.

O domínio de qualquer Arte requer disciplina. E isso significa que o aspirante tem que aprender a dominar a forma, seja essa de linguagem, cor, tom, etc. Unicamente por meio da meditação e da concentração intensa é que se conquista a habilidade em uma Arte. Por conseguinte, é compreensível que em algumas Escolas de Mistérios da Grécia, o Mestre-Artista fosse admitido ao Templo sem que executasse os exercícios preliminares. A faculdade de dominar uma arte-forma era considerada suficiente para entrar diretamente nos mais internos ensinamentos.

A história se converte em uma realidade para nós através da Arte. Os arquitetos e escultores do Egito, Assíria, Grécia e Roma deram-nos uma demonstração gráfica da civilização desses países. Temos acesso aos restos sublimes das figuras de barro e mármore. Sem podermos examinar o que há nos muros e pirâmides nas margens do Nilo e sem o nosso presente conhecimento dos edifícios e estátuas da Grécia e de Roma nossas ideias sobre a vida desses povos seriam, em verdade, confusas e irreais.

A arte do ser humano dá testemunho do seu ser interno. Nada indicará o rumo dos tempos tão precocemente como a música, a pintura, a arquitetura ou a poesia de um povo. Até parece que o artista criador pressente as sombras arrojadas pelos acontecimentos futuros. Os anseios e temores, as elevadas aspirações, assim como os sentimentos de incerteza de um povo podem ser percebidos nas obras daqueles que dedicam suas vidas à expressão de suas próprias capacidades criativas. O artista mesmo, com poucas exceções, em geral não é consciente de que suas criações são uma parte necessária e valiosa do desenvolvimento de toda a humanidade. Vive e trabalha à ordem da sua fantasia. Está satisfeito enquanto pode seguir o impulso interno que o conduz à expressão.

Quando observamos o rumo ou tendência da arquitetura moderna, da pintura e da música moderna, das diferentes nações do nosso globo terrestre, ficaremos impressionados com a similaridade dessas tendências. Nós nos veremos obrigados a admitir que universalmente o harmônico e o grotesco se revelam a si mesmos. De um modo geral podemos dizer que todas essas tendências têm muito em comum. A Arte mais moderna demonstra que as fontes profundas, ocultas, estão perturbadas e que as imagens do bom, do verdadeiro e do belo não são claramente concebidas e transmitidas.

Temos que chegar à conclusão de que, no esforço de um ser humano para criar algo e sensacional, ele exibe sua própria imagem interna, estranha e pessoal, em vez de usar as verdades espirituais que estão à sua disposição, em seus esforços de criação.

Em nossas próprias atividades devemos ser capazes de seguir as tendências originais, próprias, sempre que isso seja possível. Em nossos jardins, na ordem das nossas casas, ao servir nossas refeições ou até na seleção dos nossos quadros, nas cores das nossas roupas; em todas essas coisas devemos seguir nosso gosto individual. Existem bons livros sobre a apreciação da Arte. Devemos dedicar tempo e meditação a estudá-los.

Ao tecer os fios confusos das nossas vidas temos não somente a Lei de Causa e Efeito à nossa disposição, mas podemos sempre, dentro de certos limites, usar a Epigênese para realizar alguma obra original, alguma expressão singular. A possibilidade de originalidade é a espinha dorsal da evolução do ser humano.

Nos Ensinamentos Rosacruzes aprendemos que existe uma força dentro do ser humano em evolução que é o que torna possível o desenvolvimento. Essa força subministra algum campo para nossa capacidade criadora.

Como o expressa tão bem o poeta: “O problema maior de toda arte é produzir, por meio das aparências, a ilusão de uma realidade mais sublime” (Goethe).

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz – março/1974 – Fraternidade Rosacruz – SP)


[1] N.T.: Inferno: notas Canto XIV – da obra A Divina Comédia de Dante Alighieri

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A Importância da Astrologia Rosacruz

Apesar de ter sido considerada como ciência maldita, na antiguidade, com o decorrer dos séculos, a Astrologia acabou tomando seu lugar no tempo e no espaço, não se podendo mesmo negar o grande interesse que vem despertando, atualmente, no mundo inteiro. Embora, para a maioria das pessoas, esse interesse se apoie mais no conhecimento antecipado dos fatos futuros calcados, na maioria das vezes, nesses horóscopos de almanaque, a compreensão da finalidade real e grandiosa desta maravilhosa ciência dos Astros, já começa a manifestar-se entre pessoas de mentalidade mais aberta.

Para o Estudante Rosacruz, por exemplo, a Astrologia Rosacruz é basicamente uma ciência espiritual, uma ciência divina, que, além de revelar o ser humano a si mesmo, vem estabelecer sua relação com Deus. O Estudante Rosacruz sabe que debaixo da ordem de Deus nada acontece arbitrariamente, que cada criatura tem o destino que merece, que nasceu no ambiente exato em que deveria nascer, entre familiares com quem deverá realmente conviver, e que enfrentará aqueles acontecimentos que lhe cabem por herança de seu próprio mérito, quer sejam afortunados, quer sejam adversos.

Só mesmo a Astrologia Rosacruz pode explicar a razão das aparentes disparidades entre pessoas que nascem com um destino privilegiado, daquelas que parecem ter vindo ao mundo só para sofrer. Se existe mesmo uma lei da natureza que esteja além de qualquer dúvida, essa será, seguramente, a Lei de Causa e Efeito. Ela nos esclarece que tudo o que nos acontece são causas que nós próprios devemos ter produzido numa existência anterior, causas essas que foram as responsáveis por nosso nascimento ter ocorrido ou não, sob uma “boa estrela”.

A Astrologia Rosacruz nos conscientiza de que o propósito da vida não é conquistar a felicidade, mas adquirir experiência e formar caráter. Daí aquela expressão ocultista de que “caráter é destino”. E de onde se depreende, também, que destino é resultado do merecimento de cada um, sendo, o merecimento, por sua vez, a decorrência de um bom caráter.

Assim sendo, está claro que se quisermos melhorar as nossas condições futuras para uma vida mais sadia e equilibrada, nessa mesma vida ou nas próximas, nosso primeiro passo deverá ser o aprimoramento de nosso caráter. Podemos dizer então que, por indução, convicção na Astrologia Rosacruz requer a crença numa existência prévia, bem assim como em vidas futuras, mostrando-nos que, ao mesmo tempo em que colhemos, através do nosso horóscopo, os frutos de uma vida passada, vamos produzindo, por nossos atos atuais, as bases para um novo horóscopo, que irão, por sua vez, manifestar-se numa nova vida.

A utilidade da Astrologia Rosacruz está, realmente, no fato de nos indicar, através das posições astrais (Sol, Lua e Planetas) de nosso tema natal, os pontos vulneráveis do nosso caráter e, também, aqueles em que podemos nos apoiar para a regeneração de nossos negativismos. Isso para que, regenerados no bem, possamos elevar-nos acima de nossos sofrimentos, compreendendo também que, quando as coisas não podem ser de maneira diferente do que gostaríamos que fossem, quando não se pode tirar do caminho um pesadelo, sempre haverá um jeito de apreendermos a conviver até com a própria dor, se soubermos sobrepujar-nos a ela, por meio de uma atitude paciente abnegada. Estaremos, assim, atingindo uma nova concepção de vida, um maior equilíbrio, baseados em valores mais novos e reais, podendo também chegar à nossa própria realização espiritual que nada mais será do que o esforço consciente no sentido do certo, do bem e da verdade. Qualquer gesto, então, de real utilidade para o contexto, especialmente em favor de outrem, sem esperarmos retribuição, estará nos aproximando de nosso destino espiritual, purificando nossas vidas e, conseguintemente, dando uma força viva às configurações positivas de nossos horóscopos, em detrimento dos negativismos.

Ficará então, bem claro para nós, porque “os Astros predispõem, mas não impõem” ou porque “os Astros impelem, mas não compelem”. Saberemos, também, que na medida crescente em que a pessoa avança na evolução, menos ensejará ser dominado por seus Astros, que é marca de alma evoluída, o fato de permanecer equilibrada ante as vibrações astrais de seus temas natais, que “mesmo o barco da vida nos arrojando, muitas vezes, contra o rochedo da dor e do sofrimento” será sempre na intenção de ensinar-nos a desenvolver dentro de nós mesmos, a força da vontade, capaz de libertar-nos do domínio dos nossos Astros regentes, conduzindo-nos ao porto seguro de nosso próprio autodomínio, como já disse Goethe, o grande místico: “De todos os poderes que encadeiam o mundo, a pessoa se liberta quando adquire o domínio de si mesmo”.

Verdade que esse autodomínio não se consegue apenas num piscar de olhos. O crescimento anímico dele resultante, é, sem dúvida, um processo interno, lento, exigindo paciente persistência no bem, na ação reta. Um ou dois atos, mesmo, de serviço, de abnegação, de autossacrifício terão relativamente pouco efeito se o Ego – que é o que realmente somos – continuar dedicando a maior parte de sua vida ao serviço dos próprios interesses egoístas.

É mister nos conscientizarmos de que até o modo como agimos em nossas atividades diárias tem mais importância para a alma do que se procedermos de forma correta apenas uma ou outra vez, em tempo de maiores dificuldades. A nossa atitude sincera e desprendida enquanto fazemos nossos trabalhos de rotina, o modo como dirigimos nosso lar e nos relacionamos com nossos familiares e com nossos amigos é tão ou mais importante do que o motivo que poderá levar-nos a um ou outro gesto abnegado, feito só por obrigação.

O crescimento anímico não se consegue da noite para o dia. É uma constante no bem-proceder. Mesmo que não conheçamos a Astrologia Rosacruz e a importância que possa ter em nossas vidas, se cada um de nós criar hábitos corretos no sentido permanente do bem e da bondade, estará, mesmo sem saber, regenerando seus Astros e aproximando-se cada vez mais de sua herança divina.

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz de dezembro de 1977-Fraternidade Rosacruz-SP)

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

Goethe – Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) – autor e estadista alemão

Goethe: Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) – autor e estadista alemão que também fez incursões pelo campo da ciência natural. Foi um Iniciado.

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Mefistófeles: Em Fausto, a imortal obra-prima de Goethe, é um espírito luciférico

Mefistófeles – Em Fausto, a imortal obra-prima de Goethe,  Mefistófeles é um espírito luciférico, declara-se espírito de negação, que embora planejando o mal executa, contudo, o bem.

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A Personalidade e a Individualidade segundo os Ensinamentos Rosacruzes

Não há outro inimigo, senão nós mesmos. Enquanto houver dentro de nós um resquício sequer de Personalidade, haverá separação.

Na Fraternidade Rosacruz, distinguimos nitidamente entre Personalidade e Individualidade. Personalidade é a “persona”, o conjunto enganoso, provisório e em constante mudança formado pelas nossas sensações, emoções, sentimentos e modo de pensar. São os laços de sangue, as tradições, os elos do mundo, essas coisas mais fortes que algemas de aço, tudo a que o Cristo simbolicamente chamava de “o reino dos mortos”. O mundo, a família, os bens, tudo isso é meio de aprendizagem indispensável ao espírito, no presente estado evolutivo. Contudo, há o perigo de nos identificarmos com eles, de pensar que nos pertencem ou que lhes pertencemos, olvidando nossa origem celestial, nossa condição de espírito livre, em peregrinação e aprendizagem.

Aquele que quiser ser meu discípulo, deve abandonar pai, mãe, irmãos, amigos, tudo”, disse o Cristo. Com isso não quis significar que devamos desleixar nossos deveres de pais, filhos, irmãos ou amigos Cristãos. Ao contrário, o verdadeiro Cristão é um excelente marido, esposa, pai, mãe, irmão, amigo, porque dá à sua afeição e trabalho o mais puro pensamento, sentimento e esforço. Dá e não espera receber; ama e não espera ser amado; compreende e não espera ser compreendido. As ingratidões não lhe suscitam ressentimentos, mas o cuidado de verificar se não contribuiu para isso. O verdadeiro Cristão busca a amorosa tentativa de reconciliação; ora e espera pela pessoa que é teimosa e rancorosa.

Ser Cristão é exemplificar AMOR, em seu sentido lato. É deixar que o Cristo, em si, fale, viva, ame.

Individualidade é a expressão do EU real (o que somos de fato, Espírito), verdadeiro e superior, comandando os pares físicos, morais e mentais como instrumentos de ação.

A Personalidade é a expressão do ser humano, de baixo para cima, o “homem invertido”, os valores instintivos, colorindo desordenadamente seu modo de ser; é o amordaçamento do espírito e seu condicionamento às conveniências instintivas. Um pentagrama com a ponta superior para baixo…

A Individualidade não prescinde da bagagem de experiências anímicas; ao contrário, vale-se dela de um modo próprio, original, epigenético, criador. Porém, nós, o Espírito, é quem mandamos e orientamos. Como disse São Paulo: “Não sou mais eu quem vive, mas o Cristo em mim”; e o próprio Cristo-Jesus: “Eu e o Pai somos um”.

É certo que essa condição vamos atingindo gradativamente, em uma luta constante entre a natureza inferior e a superior, entre as trevas e a luz dentro de nós. Por isso, a lenda dos Maniqueus, referindo-se internamente ao ser humano e ao mundo, fala da guerra dos Filhos das Trevas contra os Filhos da Luz. Estes acabam vencendo aqueles; entretanto, sendo bons, não podem exterminá-los. Incorporam, pois, o reino das trevas ao da Luz; ou seja, efetuam a transmutação dos valores inferiores em valores espirituais. Os alquimistas medievais faziam o mesmo, quando falavam sobre transformar os metais inferiores em ouro. Também entre os manuscritos encontrados no soterrado mosteiro dos Essênios, Qumran, às margens do Mar Morto, há um que fala da guerra dos Filhos das Trevas contra os Filhos da Luz.

Goethe, o grande Iniciado e autor de “Fausto”, falou, pela boca de um de seus personagens: “Duas almas — ai! — lutam dentro do meu peito pela posse de um reino indivisível; uma buscando alçar-se aos Céus em ilibados anseios, enquanto a outra se agarra à Terra, em passionais desejos”. São Paulo, o apóstolo, igualmente dizia: “Pobre homem sou! O bem que desejaria fazer, não faço; o mal que não desejaria fazer, esse eu faço”.

Tudo isso mostra, de sobejo, o que todas as Escolas (como a Fraternidade Rosacruz) e Ordens ocultistas (como a Ordem Rosacruz) ensinam.

Todo Aspirante sincero à espiritualidade “ora e vigia”, sobretudo quando se acha à frente de um movimento espiritualista e deve viver o que ensina. Ao mesmo tempo, o claro entendimento dessa luta dentro de cada um de nós nos torna rigorosos conosco e tolerantes com os demais, de modo a unir e não desunir, a estimular e não censurar; enfim, “a buscar a divina essência que existe em cada um”, o que constitui a base da Fraternidade que almejamos formar, como precursores da “Era de Aquário”.

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz de setembro/1965)

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Pergunta: Conservamos o mesmo temperamento durante todas as nossas vidas?

Pergunta: Conservamos o mesmo temperamento durante todas as nossas vidas?

Resposta: O Ego pode ser comparado a uma pedra preciosa, um diamante em estado bruto. Quando é extraída da terra, a pedra está longe de ser bela; uma camada grosseira esconde o esplendor que ela encerra no seu interior. Antes que o diamante bruto se transforme numa gema, precisa ser polido por um duro rebolo de esmeril. Cada aplicação no esmeril remove dela parte da camada grosseira, e cada polimento revela uma faceta pela qual a luz penetra e é refratada num ângulo diferente ao do brilho refletido pelas outras facetas. Acontece o mesmo com o Ego. É um diamante em estado bruto que entra na escola da experiência, na peregrinação através da matéria, e cada vida é como uma fase no processo do polimento. Cada vida na escola de aprendizagem remove parte da aspereza do Ego e permite a entrada da luz da inteligência sob um novo ângulo, propiciando uma experiência diferente. Assim como os ângulos da luz variam em numerosas facetas do diamante, assim também o temperamento do Ego varia a cada vida. Em cada vida, só podemos manifestar pequena parte das nossas naturezas espirituais, realizar uma pequena parte da magnificência das nossas possibilidades divinas, mas cada existência nos torna mais completos e nossa índole tende a aperfeiçoar-se. De fato, é a ação exercida sobre a personalidade que é a parte principal da nossa lição, pois a meta é o domínio próprio, o autocontrole. Como diz Goethe:

“De todo o poder que mantém o mundo agrilhoado,
O homem se liberta quando o autocontrole há conquistado”.

(Pergunta nº 9 do Livro “Filosofia Rosacruz em Perguntas e Respostas” – Vol. I – Max Heindel)

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O que é Ser um Aspirante a Vida Superior

O que é Ser um Aspirante a Vida Superior

O Aspirante à vida superior é aquele que tomou consciência da sua responsabilidade no plano de Deus e deseja participar dele. Para isso busca, por meio do estudo, alcançar a vida superior.

Chega um momento, porém, em que sente a necessidade de dedicar-se mais. Até aqui, por meio do estudo desperta o interesse e cumpre os mandamentos de Deus. Tal qual o jovem rico na parábola dada por Cristo Jesus: “Disse-lhe o jovem: ‘Tenho observado tudo isto desde a minha infância. Que me falta ainda? ’”. Respondeu Cristo Jesus: “Se queres ser perfeito, vai, vende teus bens, dê aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me”. “Ouvindo estas palavras, o jovem foi embora muito triste, porque possuía muitos bens.” (Mt 19:20-22)

Muitos chegam até este ponto: obedecem aos mandamentos de Deus. Entretanto, o verdadeiro Aspirante à vida superior busca algo mais. Quer se livrar da escravidão que as posses terrestres lhe impõem. Quer que sua vida seja dedicada ao serviço amoroso e desinteressado aos outros.

A partir desse momento, passa a considerar tudo que possui no plano material como instrumento para o bem. Vive como propõe João na sua primeira Epístola: “não ameis o mundo, nem as casas do mundo, se alguém ama o mundo não está nele o amor do Pai.” (Jo 1:2-15).

Começa aprender a servir e compreende que a sua tarefa é aproveitar as oportunidades dadas por Deus, cultivá-las e transformá-las em poder anímico, poder da alma, que a cria e a alimenta. Aqui há um grande problema: a PRESSA. Quando decidimos caminhar em direção ao desenvolvimento espiritual estamos cheios de ânimo e não vemos a hora de alcançar a meta.

Tornamo-nos inquietos e chegamos até a agir precipitadamente. Só que não entendemos que é justamente essa atitude de inquietação e precipitação que frustra o que queremos alcançar. A natureza não dá saltos. O desenvolvimento é gradual, lento, mas seguro.

A falta de entusiasmo que sentimos e que faz parecer que em nada temos progredido é o resultado dessa discordância. O segredo está em compreender, ou tomar consciência da grande dificuldade que é mudar os nossos hábitos. É preciso muito esforço e muito tempo para formar novos e melhores hábitos no Corpo Vital.

Entretanto, uma vez formado um bom hábito, torna-se fácil praticá-lo. Contudo, para mantê-lo assim, devemos agir sempre com intensidade, firmeza e tranquilidade. Lembre-se que o que desenvolve o Corpo Vital é a repetição de coisas boas. As experiências repetidas nele criam a memória. E nesse sentido temos que ser persistentes e persistentes. “Estreita, porém, é a porta e apertado o caminho da vida e raros são os que o encontram” (Mt 7: 14).

Quando o Aspirante chega ao ponto de tomar a consciência da importância da consagração da sua vida ao serviço, ele compreende quão importante é isso, pois conhecer as leis de Deus e os mistérios da natureza é muito bom. Contudo, se não temos essa consciência de consagrar nossa vida ao serviço, nada vale o talento, a habilidade, a benevolência ou qualquer outra coisa. É isso que consegue por meio do domínio próprio. É assim que nos qualificamos para orientar os outros. Nesse ponto, o Aspirante que acha que não tem talento, não tem nenhuma habilidade para escrever ou para falar, mas que leva uma vida justa, consagrada ao serviço, cheia de ações de amor, vale mais do que o melhor orador que vive uma vida sem esforços, sem atos. Como lemos em IJo 3:18: “Não ameis de palavra nem de língua, mas por obras e em verdade”.

A persistência é fundamental nesse processo. Temos que ser persistentes em transformar nossos maus hábitos em bons hábitos. Transformar nossas habilidades em atos. Para isso precisamos fazer o que disse São Paulo: “Eu morro todos os dias”. Morrer diariamente para as coisas velhas – os maus hábitos, os vícios – de modo que as coisas novas possam ter espaço e disposição para crescer – os bons hábitos, as virtudes. Como disse Goethe, o poeta Iniciado: “Quem não experimenta morrer e nascer para vida, sem interrupção, sempre será um hóspede triste sobre essa terra infeliz”.

Nesse sentido muito nos ajuda o exercício de Retrospecção. É ele que nos faz morrer para as coisas que fizemos no dia anterior, deixando espaço e disposição para as coisas que faremos no dia seguinte. Ele é o nosso “Purgatório” e “Primeiro Céu” diários. É por meio dele que compreendemos os erros nos nossos hábitos e nos determinamos a eliminá-los ou a desfazer o mal feito. E, também, que aprovamos impessoalmente o bem praticado, determinando-nos a agir melhor. Com isso, fortificamos o bem pela aprovação e debilitamos o mal pela reprovação. Daqui notamos que o arrependimento e a reforma íntima são fatores poderosos na vida do verdadeiro Aspirante a vida superior. Praticando-os aprendemos a virtude da humildade e da esperança e, ainda, aprendemos o discernimento e a disposição em agir, pois ficamos desejosos em corrigir o mal feito.

A natureza jamais desperdiça esforços em processos inúteis. Uma vez aprendida a lição, o ensino será suspenso. Estaremos prontos para novas conquistas. Portanto, quem determina o compasso do nosso desenvolvimento somos nós mesmos. Tomemos cuidado com a impaciência e a ansiedade. Elas são manifestações da parte inferior do nosso Corpo de Desejos que sempre aspira por novidade, emoção, paixão… Porque queremos novos conhecimentos, se nem aquilo que aprendemos, praticamos?

Se, muitas vezes, não nos damos o trabalho nem de pesquisar, nem de meditar? Queremos tudo pronto e acabado. Queremos evoluir por meio de esquemas pré-estabelecidos ou formulas mágicas, como se existisse uma receita de bolo para o desenvolvimento oculto, para o conhecimento direto. Como disse Max Heindel (no livro O Conceito Rosacruz do Cosmos): “Nada realmente valioso obtém sem esforço. Nunca será demasiado repetir que não existem coisas como os ‘dons’ e a sorte. Tudo que possuímos é resultado de esforço. O que falta a um em comparação com outro está latente em si mesmo e pode ser desenvolvido quando se empregam os meios apropriados”. E todo o Aspirante ao conhecimento direto aos mistérios ocultos da natureza deve possuir um desejo intenso de adquirir esse conhecimento, lutar por ele e excluir de sua vida qualquer outro objetivo. Porém, deve ser acompanhado sempre por um desejo igualmente intenso de ajudar a humanidade, de um esquecimento de si próprio, e trabalhar para bem dos outros! Deve dar provas de desinteresse.

O conhecimento, por si só, resulta somente em intelectualidade. E intelectualidade compartilha a natureza da espiritualidade. Como diz um amigo nosso: “Há muitos intelectuais, ou que se julgam intelectuais, que nem começaram a soletrar o alfabeto divino”. Por outro lado, a experiência sem o conhecimento que a explique torna-se difícil de ser aproveitada.

A experiência ajuda-nos a melhorar, a aprimorar nossos veículos: o Corpo Denso, o Corpo Vital, o Corpo de Desejos e a Mente. É por meio dela que desenvolvemos a vontade. E essa é a força com a qual aplicamos o resultado da experiência. E é a vontade que nos faz ser persistentes e que nos ajuda a entender que: não importa o quanto falhamos, o que importa é que nunca deixemos de tentar. Pois não são os resultados, mas a sinceridade e a intensidade do nosso esforço o que conta. Daqui tiramos que o importante é fazer.

Tentar fazer o melhor que pudermos, mas fazer, não deixar de fazer. Não ter medo ou deixar de fazer algo por medo. Se quisermos aprender, temos que tentar. Mil vezes errar porque tentamos, do que por nossa omissão. O Aspirante a vida superior está sempre disposto em fazer algo, em ajudar, em servir. Ele não tem dias livres, nem de folga, nem feriados, nem férias, nem horário específico. E ainda, faz suas obras em segredo, sem propagandas ou pretensão de promoção. Contudo, sim, no completo anonimato, como disse São Mateus, no seu Evangelho, no cap. 6 vers. 1 a 3: “Guardai-nos de fazer vossas boas obras diante dos homens para serdes vistos por eles. Do contrário, não tereis recompensa junto de vosso Pai, que está no céu. Quando, pois, dá esmola, não toques a trombeta diante de ti (…) que a tua mão esquerda não saiba o que fez a direita”. Jesus Cristo disse que “o céu deve ser tornado de assalto”! Ou seja, que para alcançá-lo devemos ser determinados, decididos. Devemos estar sempre prontos a agir. Como diz São João no Apocalipse: “Não és frio nem quente, oxalá fosses frio ou quente, mas, como és morno, vou vomitar-te” (Apo 3:15-16). Não devemos ser mornos, mas sim quentes ou frios.

Do mesmo modo que a alma morre de fome se só a alimentamos com livros, com conhecimento, também morrerá se ficarmos sempre em cima do muro com medo de tomar partido por não querer magoar tal pessoa, ou correr o risco de perder tal amizade, ou por achar que não temos nada a ver com isso, ou por achar que não temos nada a dizer. Ficar de bem com todos não é ser “bonzinho” indiscriminadamente.

O Aspirante mostra coragem e exemplifica os ensinamentos nessas horas difíceis ou coloca em prova a sua determinação. Quanto maior é o pecador maior é o santo. Portanto, do ponto de vista espiritual, é preferível uma vida de erros, de atitudes erradas, mas cheia de obras, do que uma vida sem ações, enclausurada e restrita em obter conhecimentos só e em cima dos outros. O mundo necessita de seres de ação e não só de sonhadores. Quando decidimos ser Aspirante a vida superior, as pessoas ao nosso redor se voltam a nos observar! Não somos julgados pelos ensinamentos que pregamos, mas pela vida que levamos.

Exemplificaremos nossas vidas com obras do bem, intensificando nossa vigília sobre como vivemos, vivenciando os ensinamentos cristãos Rosacruzes (já que se estamos na Fraternidade Rosacruz, foi esse o método que escolhemos para se tornar um verdadeiro Aspirante à vida superior), obtendo experiências mais pela observação do que pela dor, praticando nossos exercícios – conforme fornecidos pela Fraternidade Rosacruz – sempre com mais intensidade e amor; esforçando-nos para sermos sempre maiores servidores e, assim, tornar mais conscientes nossas vidas do plano evolutivo que Deus, nosso Pai e criador elaborou para efetivarmos, de fato, a Sua imagem e semelhança.

QUE AS ROSAS FLORESÇAM EM VOSSA CRUZ

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A tentação como fator na vida superior

A tentação como fator na vida superior

No “Prolog in Heaven”, que precede Fausto, Goethe mostra o propósito interior da tentação. Quando Lúcifer pede permissão para tentar Fausto, Deus responde:

“… O homem é muito propenso a fugir,

Imperturbável, em repouso ele viveria,

Portanto, este companheiro propositalmente eu dou,

Quem agita, excita e deve como o diabo trabalha.”

No livro de Jó, Deus também sanciona a tentação de um homem bom. Quando comparamos a história da Bíblia em que Jeová levou Davi a fazer o recenseamento as pessoas (2Sm 24:1) com ICro 21:1, que diz que Satanás provocou Davi a contar as pessoas, não podemos escapar da confusão de achar que Jeová e Satanás são idênticos e, do ponto de vista comum, veja que parece extremamente injusto que tal punição severa seja aplicada a Davi, por esse ato que foi movido a fazê-lo. Mas, olhando pelo ponto de vista esotérico, todas as dificuldades desaparecem.

Jeová era o líder divino dos Semitas Originais, os antepassados ​​da raça Ária, que estavam destinados a evoluir pela razão, a faculdade pela qual “provamos todas as coisas”, para que possamos “manter firme o que é bom”. Disseram a Davi que confiasse em Jeová, que lutou por Israel quando outras pessoas obedeceram às suas ordens. Existe apenas uma maneira de tentar, quando ele ou qualquer outra pessoa se apegar ao bem – dando-lhes a chance de deixar ir; e é dever dos que são responsáveis em auxiliar que esse Esquema de Evolução prossiga verificar por tentação se aprendemos nossas lições, do mesmo modo que é dever dos professores das escolas que estudamos para a nossa educação durante essa encarnação examinar seus alunos. Cada método traz à tona pontos fracos do aluno para que o professor possa extrair uma base verdadeira para futuros esforços educacionais. Portanto, Davi foi movido por Jeová a fazer o recenseamento de Israel, para que fosse mostrado a ele se confiava na força de combate do número de homens ou no invisível Jeová, que lutou pelo Seu povo escolhido. Com esse ato, Jeová se tornou, momentaneamente, o adversário (Satanás) de Davi.

Independentemente, se esse tentador aparecer em forma corporal ou como uma voz interior, o motivo pelo qual Davi deveria ter lhe dito é que o poderoso braço de Jeová contava com mais de milhões de homens, e ele deveria ter dito a si mesmo ou a seu tentador externo: Qual é a utilidade de contar Israel? Jeová é o nosso escudo! Em vez disso, ele enviou homens para contar Israel, conforme sugerido; ele estava, sem dúvida, inflado com uma sensação de poder; talvez ele se sentiu suficientemente capaz de dispensar Jeová e seguir seus próprios ditames.

Portanto, tornou-se necessário para o Líder divino provar que ele estava enganado diante de todas as pessoas e, como eram uma raça teimosa, propensa a discordar, a lição deve ser salutar para impedir que imitem o exemplo de seu líder. A pestilência diminuiu seu número em poucos dias a tal ponto que ficou evidente, para todos, que Jeová é mais forte do que qualquer número de homens. Assim, a fé e a obediência, sem as quais nenhum líder divino pode promover novas faculdades sob suas acusações, foram fortalecidas, e Israel havia dado um passo distinto no caminho do progresso.

Todo mundo que já encarnou em um Corpo Denso foi tentado; nem mesmo Cristo escapou, e quanto mais evoluídos formos, mais sutis serão as tentações colocadas em nosso caminho. Além disso, essas tentações, frequentemente, surgem por alguém em quem confiamos plenamente, para que possamos aprender a diferenciar quanto ao mérito intrínseco de qualquer sugestão, independentemente de nossa simpatia ou antipatia, seja quem for que a sugere.

(Publicado na: Rays From The Rose Cross – jan. /1916 – Traduzido pela Fraternidade Rosacruz em Campinas – SP – Brasil)

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A Busca do Infinito: exemplos de Goethe, Dostoievski e Michelangelo

A Busca do Infinito: exemplos de Goethe, Dostoievski e Michelangelo

A perfeição é conquistada por intermédio de muitas pequenas imperfeições.

Goethe é um bom exemplo ocidental de equilíbrio. No entanto, ele nunca deixou de se queixar da dificuldade que lhe advinha em sua vida de criador. Escreve ele no Diário, em 1779: “Luto com o anjo desconhecido, até à exaustão; homem algum pode imaginar os combates que tenho que travar para produzir o pouco que peço. Que falta de ordem e de continuidade na minha ação, nas minhas ideias, na minha criação poética! Que raros foram os dias que me renderam! Meu Deus, continua a dar-me o teu auxílio; continua a dar-me a luz necessária para que eu não seja um obstáculo para o meu próprio caminho”.

Muita gente pode pensar que assim ele disse porque era jovem ainda. Contudo, que pensar do que Goethe disse 45 anos depois, no fim de uma vida plena de glória e recheada de obras-primas? Eis as suas palavras: “Sempre me invejaram por ter sido singularmente favorecido pela sorte. Também sinto que não me posso queixar e não serei eu a invectivar o meu destino. No entanto, no fundo, a minha vida foi só sofrimento e trabalho. Posso garantir que, ao longo de setenta e cinco anos, não tive quatro semanas de verdadeira satisfação. Foi sempre o mesmo rolar duma pedra, como a de Sísifo, que era preciso a cada momento voltar a levantar”.

A mulher de Dostoievski relata que seu marido sempre foi muito severo consigo próprio e que raramente os seus escritos lhe mereciam aprovação. Às vezes apaixonava-se pelas ideias dos seus romances, que trazia na cabeça durante muito tempo, mas quase nunca ficava satisfeito ao vê-las expressas. Apesar de nunca ele haver tido ideia poética mais rica do que “O Idiota”, Dostoievski dizia que não tinha chegado a dizer nele a décima parte do que queria. Para ele, não era mais do que a sombra do que vislumbrava no íntimo.

Michelangelo, após anos de trabalho, contempla pela primeira vez o teto da Capela Sistina e chora, porque não encontra nele o sonho que o inspirara. Podem vir os críticos, os professores de arte, com seu talento, a comentar e a explicar, descortinando intenções, descrevendo simetrias. Miguel Ângelo os ouve com um secreto espanto porque sabe que a realidade interna é infinitamente mais complicada e infinitamente mais simples. Podem os homens falar; ele sempre buscou o impossível até o fim de seus dias, num anseio incontido de perfeição.

Por isso, todo grande buscador, em qualquer campo, foi profundamente silencioso. Eles tinham a consciência da impossibilidade de comunicar facilmente tudo o que recebiam de dentro e do íntimo. É um silêncio de defesa e de pequenez ante o Infinito.

A experiência do grande buscador é a experiência da verdade e a impossibilidade de falar de sua experiência da verdade. Fala pouco e depois se recolhe para lá do silêncio.

No entanto, só quando chega a esse ponto pode começar a falar devidamente, POR AMOR e na medida daqueles que o ouvem, buscando dar-lhes a pouco e pouco o que alcançou.

E nesse dar descobre a chave da maior elevação que o conduz mais depressa aos altiplanos da espiritualidade, do que uma intensa busca isolada da verdade.

O anseio de perfeição, o impulso de evolução, vem-nos de dentro, do próprio Espírito, em maior ou menor grau, segundo o nível de consciência.

Na medida em que nos vamos libertando da influência da personalidade dominante e nos vamos submetendo à vontade do Eu verdadeiro e superior, é claro que esse anseio cresce, porque Ele busca a realização da verdade.

Espantamo-nos quando Max Heindel nos ensina que um Irmão Maior, está, em sua evolução de consciência, à frente de um santo, assim como um santo está à frente de um selvagem adorador de totem. Todavia, imaginem os passos dos seres evoluídos, comparados com nossos passos.

Em que proporção e intensidade influímos nós na elevação da sociedade? Pensem bem e vejam que é pequena ainda — o que não nos deve desanimar, senão estimular a evoluir mais depressa, porque, quanto mais evoluirmos, tanto mais largos serão nossos passos em direção à meta.

A ação dos seres altamente evoluídos é realmente digna de admiração e de exemplo. Com seus largos passos — quais pequenos astros — eles vão deixando um rastro luminoso à sua passagem, para iluminar e nortear os que ainda se encontram nas trevas das limitações pessoais. E damos razão ao pensador escocês Carlyle:

“A História Universal é a História dos Grandes Homens, que foram os condutores da humanidade, os modeladores, os tipos e, num sentido lato, os criadores de tudo o que as massas humanas em geral se esforçam por fazer ou alcançar. Todas as obras que vemos no mundo são, em verdade, o resultado material exterior, a realização prática e a encarnação dos pensamentos que habitam nos grandes homens enviados a este mundo. Assim, a alma da História do mundo é a história deles”.

Aparentemente, Carlyle anula a contribuição menor de todos que, com sua Epigênese, estão enriquecendo o patrimônio histórico, às gerações porvindouras. Porém, na mesma obra, ele considera como herói todo aquele que se vence diariamente ao conscientizar e deixar seus defeitos, atuando gradativamente melhor em sua vida pública, quer como padre ou profeta, quer como homem público, poeta, escritor ou artista ou artífice. Carlyle arremata: “Sempre saímos ganhando ao conhecer as obras ou dialogarmos com um deles”.

Há um eterno convite de perfeição a todo ser humano. Se ela não nos fosse possível, o Cristo não o teria dito: “Sede vós perfeitos, como é perfeito o vosso Pai celestial”. O Mestre podia vislumbrar claramente o que significa sermos “à Imagem e semelhança de Deus”; de “sermos herdeiros d’Ele”. Há um tesouro potencial em nosso íntimo, passível de enriquecer nossa consciência, quando conquistarmos nossa natureza e o desenterramos de nosso íntimo. A própria natureza de Deus está individualizada como eu ou como tu, à espera da desvelação.

Assim como a semente plantada se desmancha e se transforma, ao devido tempo, numa árvore igual àquela da qual proveio — assim também somos sementes de Deus e devemos renunciar ao que pensamos ser, para nos converter em algo maior, à semelhança e estatura d’Aquele que nos criou.

Somos gratos aos Irmãos Maiores que nos indicam o caminho mais seguro e curto. Ao mesmo tempo devemos assumir nossa própria Epigênese e percorrê-la à nossa maneira, na formação de algo diferente, individual, que seja uma contribuição a mais, no tesouro de Deus.

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz de maio/1976)

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