Agosto de 1916
De tempos em tempos, em Mount Ecclesia são recebidas cartas contando os desânimos, a falta de entusiasmo e de desencorajamento, procedentes de pessoas profundamente afetadas ou atingidas pela própria consciência por não se sentirem capazes de viver conforme os elevados ideais delas mesmas, e sentem que seria mais honesto abandonar a fé e viver como vivem os outros que não fizeram profissão de fé alguma. Asseveram que, enquanto leem, estudam ou ouvem passagens que os exortam a amar seus inimigos, a abençoar aqueles que os amaldiçoam e orar por aqueles que as maltratam, estão de acordo, em alma e coração, com esses sentimentos, e estão dispostos a seguir e cumprir alegremente estes preceitos; mas, ao deparar com tais condições no mundo, não conseguem cumprir ao mandamento bíblico e, portanto, sentem que são hipócritas.
Se o ser humano fosse um todo homogêneo, se o Espírito, a Alma e o Corpo fossem “um” e indivisíveis, seria uma verdade que essas pessoas são hipócritas. Mas o Espírito, a Alma e o Corpo não são “um”, pois isso descobrimos, para a nossa profunda angústia e tristeza, desde o primeiro dia que sentimos o desejo de trilhar o Caminho de Preparação e Iniciação Rosacruz. E nesse fato está a solução do problema. Há duas naturezas distintas em cada um de nós. Nos dias em que não alimentamos aspirações superiores, a natureza espiritual permanece adormecida e o “eu inferior”[1] é o senhor indiscutível de todas as nossas ações. Então, há paz e serenidade. Mas, no momento em que a natureza espiritual desperta, a guerra começa. À medida que crescemos na espiritualidade, os esforços extenuantes diante das dificuldades se intensificam até que, em algum momento no futuro, a Personalidade sucumbirá e alcançaremos a paz que excede todo o entendimento e compreensão.
Enquanto isso, temos a condição da qual nossos Estudantes reclamam (a exemplo de S. Paulo, de Fausto e todas as demais almas Aspirantes à vida superior): é fácil querer ou desejar, mas “não fazemos o bem que queremos e fazemos o mal que não deveríamos fazer”[2]. Este que lhe escreve tem sentido e sente mais intensamente, todos os dias dessa vida, essa discrepância entre os Ensinamentos e as próprias ações. Uma parte do seu ser aspira com um ardor que é doloroso em sua intensidade a todas as coisas mais elevadas e nobres, enquanto, por outro lado, uma Personalidade forte, extremamente difícil de dominar, é uma fonte de um contínuo sofrimento, de uma contínua aflição profunda e pungente. Mas ele sente que, enquanto não “posar de santo”, enquanto admitir, honestamente, suas deficiências e professar sua profunda angústia e tristeza por causa delas, e enquanto usar a palavra “nós” inclusivo em todas as suas exortações, ele não enganará ninguém e não será um hipócrita. Tudo o que ele diz, ele leva para si mesmo em primeiro lugar e, por mais malsucedido que seja, ele se esforça para seguir os Ensinamentos Rosacruzes. Se todos os outros Estudantes se sentem incomodados, da mesma forma que os correspondentes que inspiraram essa Carta, esperamos que isso possa ajudá-los a não desistir.
Além disso, o que mais podemos fazer senão continuar? Uma vez despertada a natureza superior, ela não pode ser silenciada permanentemente, sem correr o risco de se sofrer a miséria do arrependimento e do remorso, se abandonarmos o esforço. Já chamamos a atenção, diversas vezes, para a maneira como um marinheiro conduz seu navio através da imensidão do oceano, guiando-se por uma estrela. Ele nunca chegará a alcançá-la, mesmo assim, ela o conduzirá em segurança, desviando dos bancos de areia e das rochas, ao porto destinado. Da mesma forma, se os nossos ideais são tão elevados, a ponto de percebermos que nunca os alcançaremos nessa vida, lembremo-nos que dispomos de um tempo ilimitado ou infinito pela frente e que o que não pudermos realizar hoje, faremos amanhã e depois e nas próximas vidas. Sigamos o exemplo de S. Paulo, e pela paciente “persistência em fazer o bem”, continuemos “buscando a glória espiritual, a honra e a imortalidade”[3].
(Cartas aos Estudantes – nº 69 – do Livro Cartas aos Estudantes – Max Heindel – Fraternidade Rosacruz)
[1] N.T.: nosso Tríplice Corpo, agindo como tendo uma “vontade própria” – especialmente a parte inferior do nosso Corpo de Desejos que comanda a nossa Mente concreta –, independente de nós, o Tríplice Espírito.
[2] N.T.: “Porque não faço o bem que eu quero, mas o mal que não quero, esse faço.” (Rm 7:19)
[3] N.T.: Rm 12:12
Resposta: O que determina a conformação da substância química do Mundo Físico, na múltipla variedade de formas observadas ao nosso redor, é o Espírito Universal manifestando-se no Mundo visível como quatro grandes correntes de vida, em diferentes estágios evolutivos.
Este quádruplo impulso espiritual molda a matéria química da Terra nas variadas formas dos quatro Reinos de Vida: mineral, vegetal, animal e humano.
Quando uma forma serviu de veículo de expressão a alguma corrente de vida, as forças químicas desintegram-na, devolvendo-a ao seu estado primitivo, tornando-a aproveitável na construção de novas formas.
O Espírito ou vida que molda a forma, como uma expressão de si mesmo, é um estranho para a matéria, assim como pedreiro constitui algo à parte, independente, da casa que constrói.
Como todas as formas do mineral, vegetal, animal e a forma humana são químicas, elas devem, logicamente, estar como mortas e isentas de sensibilidade ou sentimento (como matéria química neste estado primitivo). Alguns cientistas sustentam haver sensibilidade em todo o tecido vivo ou morto, seja qualquer Reino de Vida a que pertença. Incluem igualmente as substâncias normalmente classificadas como minerais nesta afirmação. Nem todos os cientistas afirmam isso. Outra classe de cientistas afirma não haver sensibilidade no Corpo Denso, exceto no cérebro. Sustentam que é o cérebro e não o dedo que sente a dor quando o último sofre uma lesão. Cada um é parcialmente correto. Depende do que entendemos por sensibilidade. Se a configuramos como uma simples resposta a um impacto, semelhantemente ao pique de uma bola de borracha atirada ao chão, certamente é admissível atribuir sensibilidade ao mineral, vegetal e ao tecido animal. Seria absurdo, porém, atribuir sentimentos tais como prazer e sofrimento, amor e ódio, alegria e tristeza, às formas inferiores de vida.
(Publicado na Revista Serviço Rosacruz setembro/1972 – Fraternidade Rosacruz-SP)
Resposta: Quando um navio está navegando rio abaixo, a favor da correnteza, os motores operam sem esforço aparente, e o navio avança rapidamente. Da mesma maneira, quando um automóvel desce uma ladeira, o motor é capaz de carregar peso sem esforço e ele progride sem problemas. Mas, quando um navio deve navegar rio acima, contra a correnteza, ou quando um automóvel deve subir uma ladeira, isso requer um gasto considerável de esforço, e o progresso não é tão rápido. Há obstáculos a serem superados. Cada pedrinha no solo é sentida, etc.
Da mesma forma ocorre com o Espírito. Enquanto nos deixamos levar pela correnteza da vida e vamos a favor da maré da humanidade, tudo parecerá correr suavemente e não há obstáculos e nem problemas. No entanto, no momento em que deixamos a correnteza e nos esforçamos para seguir o caminho em direção à vida superior, nós enfrentamos o desacordo do curso geral da humanidade e, claro, aqueles que estão mais próximos de nós serão os que, naturalmente, provocarão maior atrito conosco. Assim, esses parecem ser a oposição, e retardar o nosso progresso em todas as ocasiões possíveis. Eles parecem se esforçar ao máximo para obstruir o nosso caminho, e nós sentimos isso mais intensamente, porque pensamos que aqueles que estão mais próximos, mais no dia a dia e mais queridos devem ser os primeiros a apreciar os nossos esforços, e nos apoiar nisso. No entanto, não é assim. Não devemos esperar isso deles. Eles estão seguindo a correnteza, indo a favor da maré. Nós estamos indo contra ela, e o atrito é tão absolutamente necessário quanto o atrito da água contra o navio que está navegando rio acima, contra a correnteza.
Ao caminhar à beira-mar, em uma praia com pedregulhos, você pode notar que os pedregulhos se tornaram arredondados e lisos, sim até mesmo polidos, graças ao atrito constante contra as outras pedras. Durante eras e eras, todas os cantos ásperos foram desgastados, e eles têm aquela superfície que é tão peculiar aos pedregulhos ao longo da praia. Podemos comparar esses pedregulhos à humanidade em geral. Pelo atrito um contra o outro por eras e eras, os cantos mais pontiagudos irão se desgastando e, finalmente, nos tornaremos arredondados, lisos, polidos e tão belos quanto o são os pedregulhos daquela praia. Mas, considere um diamante bruto: não podemos conseguir aquele polimento pelo processo lento comum, a exemplo dos pedregulhos da praia. O lapidário se encarrega dele, esmerilha-o e há um ruído estridente sempre que a pedra é tocada pelo esmeril.
No entanto, toda vez que um grito estridente alto como que expressando uma dor é emitido, há um pedaço áspero da superfície desgastado e, em seu lugar, aparece uma superfície polida brilhante. Ocorre o mesmo com o Ego que aspira a algo mais elevado. Deus é o lapidário que dá polimento à pedra, e não é nada agradável quando a parte áspera está sendo tirada de nós, quando somos pressionados contra o esmeril da angústia e tristeza mais profundas, bem como da miséria causada por grande infortúnio. Entretanto, de tudo isso sairemos cintilantes e brilhantes como diamantes. Portanto, não deixe seu coração ser perturbado, pois as angústias e tristezas profundas, bem como as tribulações que se apresentam e bloqueiam seu caminho são apenas o esmerilhamento da pedra pelo lapidário. Você pode ter certeza de que, qualquer que seja a sensação atual, o resultado será bom, pois Deus é AMOR. Embora Ele aplique as medidas mais severas no presente momento, no futuro isso o deixará polido e resplandecente.
(Pergunta 143 do livro “Filosofia Rosacruz em Perguntas e Respostas” – Vol. II-Max Heindel-Fraternidade Rosacruz)