Uma Renovada Disposição sempre Planejando para o Próximo Ano
Já sopram já mais da metade dos ventos desse ano terrestre. A parte do ano que já passou, com tudo que pôde oferecer de positivo ou negativo, considerando-se a relatividade desses dois termos, faz parte do passado. Deixou, dependendo da maneira como esse problema é encarado individualmente, um saldo determinado.
Passados mais da metade, para alguns restaram indeléveis traços de sofrimentos e decepções, amarguras e contrariedades. Outros não conseguiram apagar o estigma de tragédias que os envolveram e atingiram. Há aqueles perseguidos pela frustração de aspirações irrealizadas, de metas inatingidas. Mas alguns, talvez poucos, sentiram-se bafejados pelo êxito em suas vidas profissionais e particulares. Afinal, dizem, das crises, por crônicas que sejam, sempre alguém escapa ileso.
Uns e outros tendem a encarar o ano que virá (novo) sob uma ótica oriunda, nascida, dos percalços e sucessos de desse ano aqui. Não atinam quão irreais e enganadoras são as chamadas “vitórias” e “derrotas”. Os “derrotados desse ano” observam a quadra atual com certa dose de pessimismo. Na melhor das hipóteses, animam-se com tênues esperanças de que o presente seja menos malfazejo que o pretérito. Imaturos espiritualmente, não se libertaram de traumas passados. Tudo se lhes afigura difícil, impossível e sombrio.
Para aqueles a quem a “sorte sorriu”, as coisas, nesta nova fase, na pior das hipóteses, fluirão num mesmo nível. Permitem-se até dormir sobre os louros de suas realizações, como se o amanhã não fosse outro dia.
Observa-se, aí, como o ser humano comum é dominado por uma preocupação obsessiva de tudo rotular — bem/mal, bom/mau, triunfo/fracasso — à luz de seus superficiais conhecimentos.
Tanto para os “deserdados” como para os “afortunados” dessa parte do ano para trás houve apenas sepultamento. O corpo encontra-se enterrado, mas o defunto permanece fresco, podendo ser exumado a qualquer hora. Sua lembrança persegue-o tenazmente, com sua carga desestimulante ou ilusória.
Felizmente, há quem logre sobrepor-se a esse estado de espírito. São as chamadas “almas velhas”, espíritos mais evoluídos, têmperas forjadas na crueza e experiências de vidas passadas. Dotados de natureza intimorata, hoje, imperturbáveis, sabem como enfrentar os desafios do mundo.
Não se amedrontam, desconhecem a inibição diante de circunstâncias adversas, mas ninguém os vê exibir arrogante autossuficiência. A modéstia é seu apanágio. São equilibrados, justos e sensatos.
Cônscios de seu progresso, nem por isso deixam de reconhecer que o caminho da perfeição é infinito. Conservam a mente aberta e o coração radiante, dispostos a haurir os mais valiosos ensinamentos do cotidiano. Sabem que ainda muito têm a aprender e crescer, num futuro suscetível de desdobrar-se em mil caminhos diferentes.
Esses não sepultaram a parte do ano que já passou. Cremaram-no. Não buscam desenterrá-lo constantemente, reabrindo velhas feridas. Não. Reduziram-no a cinzas. Basta-lhes apenas ter assimilado o valor educativo das experiências pelas quais passaram. É o suficiente para servi-lhes de orientação e inspiração no ano recém-iniciado.
Aos acontecimentos passados, só lhes atribuem valor como lições de vida. O novo ano, afirmam, deve ser bem recebido. Merece ser visto com bons olhos. Afinal, quantas oportunidades de crescimento anímico e mesmo de progresso material ele poderá nos oferecer!
Nessa abençoada seara que é o mundo, a cada momento se nos surgem valiosas ocasiões de empregarmos nossas faculdades epigenéticas. Assim, cabe-nos tentar, sempre que possível, criar algo novo ou melhorar o já existente. Todas as coisas clamam por um toque de aperfeiçoamento, de inovação, de originalidade. Em tudo há sempre uma beleza recôndita, esperando por ser desvelada.
No limiar de um novo ciclo, o melhor que cada um pode fazer é arregaçar as mangas e renovar sua disposição para o trabalho. Há muito por construir. Nada de lamentar o mal acontecido, nem de deslumbramentos com conquistas já ultrapassadas. Não se pode viver do passado. O que “está feito está feito”. As lições, sim, servem para alguma coisa.
Estimado amigo, o que você fez até aqui, nesse ano? Enterrou? Cremou?
(Publicada na Revista Serviço Rosacruz – 01/1978)