O Sol Místico da Meia Noite no Natal
Mais uma vez, a dança circular mística revelada do Sol vai sendo executada em sua órbita e, novamente, ficamos aguardando com um regozijo antecipado o nascimento de um novo Sol para nos levar ao próximo ano. Não obstante a Grande Guerra[1], o Espírito do Natal está no ar, o espírito da expectativa, o sentimento de que algo novo está entrando em nossas vidas e que o futuro será mais brilhante do que o passado e isso tudo será para todos. Embora todas as calamidades e sofrimentos contidos na Caixa de Pandora[2] pareçam estar no lado de fora nesse momento, a Esperança, o presente celestial dos Deuses, sorri nos encorajando, enquanto ela aponta para o revestimento prateado da grande nuvem da guerra e, nos diz que, por trás dessa nuvem, o Sol da paz e alegria será mais luminoso do que nunca, e que atualmente iluminará a Terra com um esplendor tal que nunca foi apreciado por nós.
Contudo, existem alguns que são fisicamente cegos e, embora o Sol nunca brilhe tão intensamente, eles não o percebem. Também, existem aqueles que são espiritualmente cegos e, consequentemente, incapazes de ver a grande onda espiritual que desce anualmente sobre a Terra. Devemos ter dentro de nós esse órgão de percepção, pois, como diz Angelus Silesius:
“Embora Cristo nasça mil vezes em Belém,
Se não nascer dentro de ti, tua alma seguirá extraviada.
Olharás em vão a cruz do Gólgota,
Enquanto ela, também, não se erguer em teu coração”.
Ano após ano, o místico iluminado vê esse grande Drama Cósmico, da descida do Espírito na matéria, ocorrendo ante sua visão espiritual. Não é uma visão vaga e indefinida e dependente de certos sentimentos, mas é uma apresentação clara e precisa nos mínimos detalhes. Não é necessário que o espírito nos Mundos invisíveis assuma uma determinada forma definida, exatamente como fazemos no Mundo Físico, pois, qualquer forma que tenha um certo contorno nítido implica em limitação.
Um espírito pode permitir que sua forma se misture com às formas de outros espíritos, podendo permear até os Corpos Densos de outros e ainda reter sua própria individualidade, porque ele vibra em um certo tom ou nota-chave diferente daquela de todos os outros. Assim, em setembro, o Clarividente iluminado percebe o Espírito Crístico Cósmico como uma poderosa Onda de Luz de supremo esplendor, descendo sobre a Terra que Ele permeia.
Em torno do dia 21 de dezembro, essa luz celestial alcança o centro de nossa esfera terrestre. Então os dias são mais curtos, as noites são mais longas e mais escuras, “mas a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam”. Os impulsos vibratórios motrizes fornecidos à Terra, durante os primeiros meses de cada ano, quase se esgotaram; no Natal, a Terra está cristalizada, morta e fria, e se essa nova vida do Espírito de Cristo não fosse derramada na Terra para renovar suas energias por mais um ano, toda a vida em nosso Planeta pereceria.
Sempre houve muita especulação sobre a natureza da estrela que brilhou em Belém à meia-noite. A opinião Ortodoxa sustenta que a Imaculada Concepção e o Nascimento de Jesus são os únicos na história da onda de vida humana; ela supõe que a Estrela de Cristo foi vista no firmamento apenas naquela ocasião; mas os sábios que, pela alquimia do crescimento anímico, estão se esforçando para construir dentro de si a pedra angular que foi rejeitada pelos construtores, mas que é valorizada por todos os filósofos, sabem que a Luz de Cristo não pode ser encontrada fora de nós.
Eles sabem que o axioma hermético que expressa a lei da analogia “como acima é embaixo” também se aplica nesse caso, e que o Cristo formado dentro deles deve procurar a Estrela do Cristo dentro da Terra, pois, novamente citando Angelus Silesius, “seria impossível para um Cristo salvar o Mundo, estando fora da Terra, como é para um Cristo no Gólgota nos salvar”. Até que o Cristo nasça dentro de nós, e até que o Cristo nasça dentro da Terra, Ele não pode realizar Sua missão.
Portanto, na noite mais longa e mais escura de cada ano, o Místico se ajoelha em silenciosa adoração, olhando internamente por meio da visão espiritual. Cultivada por ele, em direção ao centro da Terra, onde a maior e mais elevada Luz que já brilhou na terra ou no mar, ilumina o mundo inteiro com resplendor e luminosidade que são avassaladores.
E então, o ser humano sábio traz seus dons e os oferece aos pés do recém-nascido Salvador. Ele pode ser pobre diante dos bens materiais do mundo; pode até não ter um lugar para descansar a cabeça, no entanto, seus dons são mais preciosos do que qualquer quantia extremamente grande de dinheiro que se possa imaginar. Durante sua vida de Aspiração, ele cultivou bens preciosos e o primeiro a ser oferecido no altar do sacrifício é o Amor.
“O amor não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconveniente, não busca os seus interesses, (…) não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; (…) se houver profecias, falharão, e se houver ciência desaparecerá, porque agora permanecem a Fé, a Esperança e Amor, mas, a maior das virtudes é o Amor”[3]. “Deus amou tanto o mundo que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que n’Ele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”[4]. E esse grande presente não foi dado para sempre, mas, a cada ano o Filho de Deus renasce, novamente na Terra, para vivificar esse Planeta com Suas vibrações superiores, para que possamos ter vida e vida em abundância.
Assim como o Espírito Humano morre no plano espiritual quando nasce no Mundo Físico, também o Espírito de Cristo morre na Esfera Solar quando, por nossa causa, nasce na Terra na época do Natal. É confinado pelo ambiente de cristalização que criamos. Verdadeiramente, “ninguém tem maior amor do que dar a vida por seus amigos”[5], e Cristo disse: “Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu mando, (…) e esse é o meu mandamento: amar uns aos outros” [6].
Portanto, o Amor do místico, oferecido sobre o altar de sacrifício no grande festival da noite Santa, não é abstrato, mas se expressa em atos concretos para com todos com quem ele entra em contato durante o ano seguinte. Seu segundo presente para o recém-nascido Salvador é a devoção. O fogo do entusiasmo deve arder no peito de todo Aspirante, pois nenhuma observância fria dos ritos religiosos, nenhuma entrega de presentes sem esse sentimento intensamente devocional pode ter qualquer valor na luz espiritual. Foi dito que um dos antigos Reis Israelitas praticou o mal com ambas as mãos avidamente; assim também o Aspirante deve praticar o bem com ambas as mãos avidamente: todo o seu coração, toda a sua alma e toda a sua Mente devem ser oferecidos sobre o altar do sacrifício, e como se diz: do mesmo modo que o incenso dos sábios, mencionados na Bíblia, encheu o lugar da natividade com perfume, assim também, deve esse fogo de entusiasmo acender nossa devoção, para que o incenso possa penetrar em todo o ambiente com a devoção para a causa do Mestre.
Contudo, o Amor, a Devoção e o Entusiasmo oferecidos pelo místico sobre o altar do recém-nascido Cristo não são separados e afastados de d’Ele mesmo. Ele não pode dar sem incluir o maior e melhor de todos os presentes, o único presente valioso; ou seja, Ele mesmo. Não importa qual seja sua posição na vida, elevada ou baixa, rica ou pobre, essa não é uma preocupação de Cristo. O espírito falando com ele sempre lhe diz: “Filho, eu não desejo aquilo que é teu, pois isso já é Meu; a Terra e a sua plenitude, o gado nas mil colinas, todos foram feitos por Mim e através de Mim[7], contudo, o que eu desejo é você mesmo, o seu coração. Dá-me o teu coração, Filho, e eu te darei o que é mais do que tudo, a Paz que supera todo o entendimento”[8]. E possa a Pomba da Paz, o Amor de Cristo, logo encontrar um novo apoio em nosso mundo desgastado por essa guerra.
(De Max Heindel, publicado na Revista Rays from the Rose Cross de janeiro de 1916 e traduzido pela Fraternidade Rosacruz – Campinas – SP – Brasil)
[1] N.T.: Refere-se à Primeira Guerra Mundial
[2] N.T.: Caixa de Pandora é um artefato da mitologia grega, tirada do mito da criação de Pandora, que foi a primeira mulher criada por Zeus. A “caixa” era na verdade um grande jarro dado a Pandora, que continha todos os males do mundo.
[3] N.T.: ICor 13:4-13
[4] N.T.: Jo 3:16
[5] N.T.: Jo 15:13
[6] N.T.: Jo 15:14-17
[7] N.T.: Sl 50:10
[8] N.T.: Pb 23:26 e Fp 4:7