Isaac Newton escreveu sobre o tema de Deus, num lugar muito inesperado, a saber, no final da sua incomparável obra: Principia, ou Princípios Matemáticos da Filosofia Natural[1], do qual Laplace, o grande gênio matemático francês, disse que era “preeminente acima de todas as outras produções do intelecto humano”, enquanto o próprio Newton afirmou que Laplace foi “o maior homem que aparece na história da ciência e, possivelmente, o maior intelecto que já trabalhou na Terra”.
Num “escólio geral”, no final de sua poderosa obra-prima de raciocínio matemático. Newton escreve sobre o Sistema Solar e sobre os sistemas de estrelas fixas que eles só poderiam proceder do “conselho e domínio de um Ser inteligente e poderoso”. Em seguida, ele desenvolve sua ideia de Deus, em frases comedidas que são como um magnífico cântico de louvor, irrompendo inesperadamente nos ouvidos à medida que o leitor emerge da lógica severa e seca das demonstrações anteriores. Sua beleza é realçada pelo sonoro latim com que Newton, de acordo com a prática dos seres humanos eruditos de sua época, apresentou os Principia.
“Esse Ser”, diz ele, “governa todas as coisas, não como a alma do mundo, mas como Senhor de tudo… O Deus Supremo é um Ser – eterno, infinito, absolutamente perfeito… A palavra Deus geralmente significa “Senhor”, mas nem todo senhor é um Deus. É o domínio de um ser espiritual que constitui um Deus… E de Seu verdadeiro domínio segue-se que o verdadeiro Deus é um Ser vivo, inteligente e poderoso, e de Suas outras perfeições que Ele é supremo ou perfeito. Ele é eterno e infinito, onipotente e onisciente; isto é, Sua duração atinge de eternidade a eternidade. Sua presença de infinito a infinito. Ele governa todas as coisas e conhece todas as coisas que são ou podem ser feitas. Ele não é eternidade ou infinito, mas eterno e infinito. Ele não é duração ou espaço. Ele dura para sempre e está presente em todos os lugares, e existindo sempre e em todos os lugares, Ele constitui a duração e o espaço….
“N’Ele estão todas as coisas contidas e movidas, mas nenhuma afeta a outra. Deus não sofre nada com o movimento dos corpos; os corpos não encontram resistência à onipresença de Deus. Assim como uma pessoa cega não tem ideia das cores, também não temos ideia da maneira pela qual o Deus onisciente percebe e entende todas as coisas. Ele é totalmente desprovido de todo corpo e figura corporal e, portanto, não pode ser visto, nem ouvido, nem tocado, nem deve ser adorado sob a representação de qualquer coisa corpórea.
“Nós o conhecemos apenas por Sua mais sábia e excelente contribuição de coisas e causas finais. Nós O admiramos por Suas perfeições, mas O reverenciamos e adoramos por causa de Seu domínio, pois adoramos a Ele e a Seus servos, e um Deus sem domínio, providência e causas finais nada mais é do que destino e natureza. A necessidade metafísica cega, que certamente é a mesma sempre e em toda parte, não poderia produzir nenhuma variedade de coisas.
“Toda aquela diversidade de coisas naturais que consideramos adequadas a diferentes épocas e lugares não poderia surgir, senão das ideias e da vontade de um Ser necessariamente existente. Mas, a título de alegoria, diz-se que Deus vê, fala, ri, ama, odeia, deseja, dá, recebe, regozija-se, zanga-se, luta, enquadra, trabalha, constrói; pois todas as nossas noções de Deus são tiradas dos caminhos da Humanidade por uma certa semelhança, que embora não seja perfeita tem, no entanto, alguma semelhança. E isto a respeito de Deus, cujo discurso sobre a aparência das coisas certamente pertence à filosofia natural”.
As ideias de tal ser humano devem possuir um interesse perpétuo. As pessoas que pensam que a ciência, desde os tempos de Newton, demoliu Deus estão fatalmente enganadas. Lendo apenas partes do argumento de Newton acima, alguns podem imaginar que Deus foi identificado com o que a ciência moderna chama de “Éter” ou com aquela coisa onipresente chamada eletricidade, mas para Newton não tinha tal significado. Ele insistiu em Deus como um Ser que contém e controla a Natureza por Sua vontade e providência.
(Publicado na Revista Rays from the Rose Cross de junho/1918 e traduzido pelos irmãos e pelas irmãs da Fraternidade Rosacruz em Campinas-SP-Brasil)
[1] N.T.: Princípios Matemáticos da Filosofia Natural (em latim: Philosophiae naturalis principia mathematica, também referido como Principia Mathematica ou simplesmente, Principia) é uma obra de três volumes escrita por Isaac Newton, publicada em 5 de julho de 1687. Newton publicou outras duas edições, em 1713 e 1726. Este trabalho é considerado uma das obras fundamentais mais importantes realizados em mecânica no século XVII. Provavelmente o livro de ciências naturais de maior influência já publicado, contém as leis de Newton para o movimento dos corpos, fundamentação da mecânica clássica, assim como a lei da gravitação universal. Newton demonstrou as leis de Kepler para o movimento dos planetas (que haviam sido obtidas empiricamente).