A Transição

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

A Transição

A Transição

Um sábio vivia num país distante, amado por todos que o conheciam. Durante muitos anos, o povo o procurava, pedindo conselhos, ou simplesmente desejando ouvi-lo falar.

Falou das sabedorias dos antigos e, embora muitas vezes não entendessem completamente o significado das suas palavras, eram aconselhados e confortados pela abundância de amor e simpatia que dele emanavam. O sábio tinha uma filha, a quem ele amava; e que a seu tempo seria capaz de adquirir a graça e sabedoria do pai.

Um dia, quando ele sentiu que o tempo da sua transição estava perto, falou com ela. “Minha criança” disse, quando ela sentou numa almofada à sua frente, deitando a cabeça no seu joelho,”o tempo da minha transição está chegando, vou logo partir para os reinos mais altos, e eu estou contente. Desenvolvi aqui e embora meu corpo tenha me servindo fielmente e bem; será um alívio me desprender do seu peso”.

Ela sorria para ele: “Eu sei pai, também senti que você vai nos deixar. Sentiremos falta, mas você realizará maiores trabalhos no mundo superior, onde viverá. Estou certa de que isto acontecerá”.

Seu pai a olhou fixamente com afeição, acariciando seus cabelos vendo-os brilhar à luz do Sol. Desde quando era uma menininha, seus momentos mais preciosos eram aqueles; quando ela deitava sua cabeça dourada no seu joelho e conversavam juntos com o maior entendimento e confiança. De tudo que ele mais amou na terra, e do que mais sentiria falta, era sua filha. Mas, sabia também, que apesar da vastidão do mundo, nunca estaria longe dela.”Uma coisa me perturba filha? disse ele. Sei que você não vai prantear a minha partida, com lágrimas e lamentos e por isso sou grato. Mas, eu me preocupo com os outros, – aqueles que vierem a mim buscar conforto e consolo – aqueles lamentarão minha passagem e se afligirão grandemente. Não por mim deploro isso, mas por eles mesmos. Sofrimento deste tipo, só pode ser destrutivo, como você já sabe.

“Sim, eu sei pai”, respondeu; “mas acredito que será mais fácil a mim proteger-me da aflição, do que para os outros. Estou contente por você porque sei como será livre e verdadeiramente vivo na sua nova condição.

Além disso, sou afortunada por lembrar-me das experiências que tive durante o sono, eu vi, como os outros que já partiram são mais felizes. Muitas pessoas que vivem na terra, não é tão afortunada como eu. Para eles, perdendo alguém que ama, o mundo toma-se vazio, porque eles não podem ver que aqueles que já partiram estão vivos no outro lado”.

O sábio continuou: “Esta é a razão porque pergunto se você ajudará aos outros quando eu já tiver partido. Lembre-se de que eu estarei ocupado com um trabalho novo e embora fique frequentemente com eles, isso não será óbvio nas suas horas de vigília. Urge a eles, da melhor maneira que possam; transmutar suas lágrimas em ação positiva.

Exorte-os a intensificar seus trabalhos aqui na terra, porque nada poderá superar melhor o luto e a dor”.

“Eu farei pai, eu o farei “ela assegurou. Por longo tempo sentaram juntos, falando pouco, mas, unidos em harmonia e profundo amor.

Na manhã seguinte, quando os adeptos se juntaram embaixo do grande carvalho, onde sempre se encontravam, foram surpreendidos ao ver a filha vir ter com eles. Frequentemente acompanhava o pai a estas reuniões, mas nunca antes viera sozinha. Estava vestida com um longo e flutuante vestido branco, seus cabelos estavam amarrados com um laço dourado.

Sorria gentilmente para os adeptos, que esperavam por uma explicação. Um ou outro teve o pressentimento súbito do que ela iria falar, suspiraram e olharam para longe.

“Queridos amigos” começou ela, “hoje de manhã meu pai passou, para os mundos superiores. Seu tempo na terra se esgotou, e consideravam-no com mérito para um trabalho maior. Ele se regozija por estar livre das dores terrenas, e ansioso por começar seus novos deveres. A ajuda na sua transição, foi confiada a um dos Iluminados Seres e partiu com muita paz”. A jovem parou de falar e olhou para os adeptos. Alguns choravam abertamente, outros a olharam como se não pudessem acreditar no que ouviam, outros -os mais velhos – balançavam a cabeça com inveja. “Sim; sim”, disse um deles suavemente, “era seu tempo”. “Mas o que nós vamos fazer?” gritavam alguns. “Sem ele não podemos viver, que faremos sem ele?”

“Nós devemos trabalho, todos temos trabalho a fazer, um vasto trabalho”, falou a jovem com a voz desapaixonada.

“Ele ofereceu conselhos e mostrou o caminho. Ele revelou muito, o que somos afortunados em conhecer. É por isso, por conhecermos a verdade, que somos obrigados a usar dela na nossa vida. Ele fez a sua marca. Então, agora é o tempo de nós fazermos a nossa.”.

A jovem suspirou fundo e indo embora falou suavemente: “Meu pai não queria que o pranteassem. Eu sei disso e no fundo do coração vocês também o sabem. Regozijem-se por ele – regozijem-se com ele – para que ele tenha bom motivo para estar contente. E mesmo que vocês nunca se comuniquem com ele, eu rezo a vocês para que não deixem a tristeza de seus corações pesar em cima dele”.

Outra vez a jovem os olhou gravemente, suplicante. “Seu último pedido foi que eu recomende a vós a submergir na ajuda aos outros. E eu acrescento a este pedido o meu: ponham os seus ensinamentos em prática. Façam com que se tornem parte das suas vidas – do seu próprio ser. Assim ele estará mais com vocês do que quando em seu corpo físico”.

Por longo tempo os adeptos permaneceram juntos, cada um com suas lembranças dos dias passados com o sábio, e meditavam sobre as coisas que sua filha lhes transmitiu.

Então, um levantou-se e falou: “a jovem está certa, convém que façamos o que ela pediu. Embora aquele que nós amamos tenha partido, deixando “seu corpo físico, ele é imortal nos céus como nós também. E podemos nos imortalizar mais na terra, servindo como ele nos ensinou. Vamos amigos, deixem de sofrer e cuidem de seus trabalhos”.

Um ano depois, os adeptos se reuniram outra vez embaixo do velho carvalho. O ano anterior dedicaram à uma escola, onde transmitiam os ensinamentos que aprenderam com o sábio, para aquelas que tinham ouvidos para ouvir.

O apelo do sábio para servir não foi desatendido e aconteceram muitas mudanças na região. Mendigos que antigamente, passivamente, lamentavam queixosos na beira da calçada, foram ensinados a ajudar a si mesmos e a ganhar o seu sustento, trabalhando, produzindo seu próprio alimento. Alguns adeptos trabalhavam sem compensação nos lares ou campos dos pobres, ajudando com trabalhos caseiros cotidianos e cuidando dos doentes. Outros reuniram crianças ao redor deles e infundiram o conhecimento do bem e da dignidade. Alguns fundaram hospitais, onde os doentes e sofredores recebiam conforto.

Neste dia de reunião, os adeptos saudaram uns aos outros, alegremente ansiosos por ouvir o relato de novidades que aconteceram nos doze meses passados. A filha do sábio estava ali, também, era ela a professora da nova escola. Quando passou entre os adeptos, apertando a mão de uns, abraçando outros, eles se maravilharam pela sua maturidade, compostura e beleza intensificada, que irradiava dos seus traços e da sua capacidade.

Evidentemente ela era digna sucessora do pai.

Então a cerimônia da dedicação começou. Orações eram oferecidas; palavras foram ditas, canções eram cantadas e este era o tributo amoroso, cheio de respeito à memória abençoadado sábio, que era o instigador de tudo que era bom.

Quando o último orador voltou ao seu lugar, ouviu-se um inesperado arquejo dos presentes. A figura familiar do sábio, vestido com um simples manto marrom que ele sempre usava, estava em pé visto tenuemente ao lado da multidão. A amada face outrora enrugada pela idade, era agora lisa, com brilho extraterreno, amoroso e entusiasmado. Era realmente o sábio, transmutado pelas características do mundo superior e sem dúvida reconhecido por todos. A figura permanecia sorrindo e abençoando com o olhar caloroso e aprovativo dos seus adeptos. Então, desapareceu.

Por momentos todos permaneceram em silêncio. Então, viraram-se e foram seguir seus caminhos separados.
A cerimônia terminou. Estava bem completa.

(Publicada na Revista ‘Serviço Rosacruz” – 01/86 – SP)

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