Histórias Aquarianas para Crianças: A Lição de Marinho

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

Histórias Aquarianas para Crianças: A Lição de Marinho

Histórias Aquarianas para Crianças: A Lição de Marinho

Era uma vez, quatro pequenos pica-paus chamados Petri, Chipe, Margo e Marinho. Eles moravam com seus pais num grande e confortável buraco, num carvalho muito velho. Petri, Chipe e Margo eram bons pica-pauzinhos. Eles traziam para casa ótimos boletins da escola de voo, comiam suas minhocas com bons modos e aprendiam a fazer buracos limpos, sem deixar atrás muita serragem.

Marinho, porém, era um problema. Nunca prestava atenção nas aulas da escola de voo, estava sempre fora de forma — deslizando, quando deveria estar batendo as asas; subindo, quando deveria estar descendo — e se perdendo em voos de longa distância. Seus modos eram deploráveis. E os buracos que ele abria — bem, você deveria tê-los visto! Eles eram sujos, mal feitos e sempre ficava um amontoado de serragem e cascas de árvores no chão, quando ele terminava. Uma vez, Marinho deixou cair um punhado de serragem na sala da casa da Senhora Godoy, que morava embaixo da árvore onde Marinho estava abrindo um buraco. Você pode estar certo que ela foi contar a Senhora Pica-pau o que ela pensava daquilo em termos bem compreensíveis.

Um dia, Mamãe Pica-Pau teve que ir ao armazém. Antes de sair, ela chamou as crianças e disse:

— Enquanto eu estiver fora, vocês podem bicar o carvalho, podem bicar o olmeiro, o bordo, mas não os postes de telefone, porque eles pertencem às pessoas e não à floresta e nós não devemos ser descuidados e não devemos incomodá-los. Vocês entenderam?

— Sim, mamãe – Disse Petri.

— Sim, mamãe – Disse Chipe.

— Sim, mamãe – Disse Margo.

— ‘Tá legal – Disse Marinho.

Mamãe Pica-pau, que já tinha aberto suas asas para voar, abaixou-as e voltando-se para Marinho:

— O que foi? – Perguntou ela.

— Sim, mamãe – Disse Marinho relutante.

— Assim está melhor – Disse mamãe Pica-pau. E espero, Marinho, que, pelo menos desta vez, eu possa sair e voltar sem que você se meta em confusão.

Marinho encolheu os ombros e não respondeu. Mamãe Pica-pau, com uma expressão infeliz na sua face, voou embora.

— Realmente, Marinho, disse Petri, que era o mais amável dos quatro pequenos pica-paus e estava muito preocupado com as malcriações de Marinho, você deveria ser mais educado com a mamãe. Não vê como ela fica triste quando você não se comporta?

— Ah, lorota – Disse Marinho sentando-se, mal-humorado, na porta do buraco.

— Venha, disse Chipe. Vamos até aquela árvore ver se nós conseguimos encontrar alguns bichinhos. Estou morrendo de fome.

Petri, Chipe e Margo apostaram corrida até a árvore e Marinho, ainda mal-humorado, seguiu-os, voando devagar. Em pouco tempo, os pequenos pica-paus e mesmo Marinho estavam ocupados fazendo buracos. Acharam muitos bichinhos e logo Chipe matou sua fome.

— Eu vou praticar bicando desenhos no carvalho, disse Margo, que era a artista da família e, sinto dizer, um pouco vaidosa.

— Vou lhe fazer companhia – Acrescentou Petri.

Talvez eu possa terminar aquele lenço de pétalas de flor que estava fazendo para mamãe.

— Bem – Falou Chipe. Vou ver se Cal Cardinal está em casa. Talvez a gente possa jogar tênis. Vi um monte de bolotas caídas que parecem pular bastante. Você vem, Marinho?

— Não, respondeu Marinho, puxando com o bico a casca do olmo, que começou a balançar seus galhos em sinal de aviso e Marinho parou.

— O que você vai fazer? – Perguntou Chipe.

— Não sei – Retrucou Marinho amuado.

— Bem, nós já vamos indo. Você sabe onde nos encontra se quiser brincar.

Com isso, Chipe, Petri e Margo levantaram voo e Marinho ficou sozinho no galho.

Marinho sentou-se, pensando no que iria fazer. Não havia nada que ele realmente quisesse fazer, a não ser talvez, voar para o vale e tirar a casca das bétulas. Isso era bem divertido, pois a casca saía facilmente em longas e bonitas tiras. Mas, na última vez que ele fez isso, o líder dos duendes, que morava ali, reclamou para mamãe Pica-pau e ele ficou em má situação.

Parecia que as pessoas estavam sempre reclamando dele para sua mãe. Por que elas não o deixavam em paz?

Marinho voou sem rumo. Não estava com vontade de brincar com ninguém em especial e certamente não queria praticar suas lições de voo ou fazer buracos. Não estava com fome e por isso não queria sair caçando bichinhos. O que ele realmente queria era fazer alguma coisa diferente.

Sem pensar para onde ia, Marinho voou para à estrada onde estavam os postes telefônicos. Uma vez, seu primo Alberto fez um enorme buraco em um poste de telefone e, em seguida, foi apanhado, ficando em apuros. Mas, ele afirmou que, caso tivesse uma oportunidade, faria isso de novo porque há um sabor especial nos postes de telefone, embora os insetos não se aproximem deles.

Marinho empoleirou-se no primeiro poste de telefone que encontrou e olhou-o de cima. Era realmente comprido. Que mal haveria em fazer um pequeno buraco naquele poste, bem em cima, perto do topo onde ninguém pudesse ver? Ele adoraria poder dizer a Alberto que também tinha feito isso.

Marinho olhou ao seu redor. Não havia ninguém por perto, exceto a Senhora Coelha, tão apressada com a cesta de compras que não podia reparar no que ele estava fazendo. Só uma provadinha, só para sentir — e, então, iria jogar tênis com Chipe e Cal e ninguém jamais saberia.

Tudo certo — ele faria isso! Nada poderia acontecer.

Marinho olhou mais uma vez ao seu redor e começou a trabalhar: furou o lado de fora do poste e certamente não gostou. Ugh! O que os homens colocavam nessas coisas para que ficassem tão azedas? Certamente nada nascia com aquele gosto.

Alberto estava louco. Isso não era bom — era horrível!

Marinho estava prestes a parar, enojado, quando provou algo diferente — algo doce e incomum. Era parecido com a mistura da seiva de várias árvores. Marinho furava cada vez mais fundo. Alberto, parece, tinha razão. Uma vez passada a parte externa, aí ficava um verdadeiro regalo.

— Puxa, como isto é bom! Marinho furava cada vez mais, saboreando aquela coisa deliciosa. Ele teria que contar isso a seus irmãos. Mesmo Petri, que nunca fazia nada errado, teria que experimentar.

Marinho continuou furando. Em pouco tempo, o minúsculo buraco foi transformado numa enorme fenda com muita sujeira. Ele já não estava tomando nem um pouco de cuidado. Esqueceu tudo, menos de concentrar-se para conseguir cada vez mais pedacinhos saborosos. À serragem voava para todo lado e ninguém, vindo da estrada, poderia deixar de ver aquele monte acumulado no chão.

Marinho estava com a cabeça enterrada no poste e continuava cavando. De repente, parando para tomar fôlego, ouviu um terrível berro do chão. Ficou muito assustado: as penas e suas costas ficaram em pé. Tirou a cabeça do buraco com cuidado e olhou para baixo. Viu um carro parado perto do poste e, ao lado, agitando os punhos em sua direção, o Homem da Companhia Telefônica!

Ele estava dizendo alguma coisa — ou melhor, gritando. Estava muito longe para Marinho entender — o que dava na mesma — mas sabia que o homem estava muito bravo. Ele sacudiu mais uma vez os punhos e gritou muito alto. Aí, então, voltou-se rapidamente, entrou no carro, bateu a porta e saiu tão depressa que espalhou para todos os lados a serragem acumulada no chão.

Marinho sentou-se no topo do poste sentindo-se fraco até para voar. Sabia que o homem da Companhia Telefônica contaria a seus pais e este problema seria provavelmente o maior que ele já tivera. Perdera até a vontade de continuar o buraco — na realidade, ele estava com dor de estômago.

— Oh, céus! Que farei? Gostaria de poder voar para longe e nunca mais voltar, mas estou muito fraco por causa do susto e sentindo-me mal com todo aquele poste telefônico que comi. Não conseguirei voar nem até a árvore mais próxima!

Duas grandes lágrimas rolaram em seu rosto, suas penas murcharam, e suas asas estavam totalmente caídas. Ele começou a sentir tonturas e, apavorado, viu que estava tendo grande dificuldade para manter-se equilibrado no topo do poste. Uma coisa que nunca havia acontecido antes! Ele balançava perigosamente para frente e para trás e percebeu que cairia, se não fizesse alguma coisa. Havia apenas uma coisa para fazer — a pior coisa que poderia acontecer a um pica-pau. Teria que descer e ficar no chão até sentir-se melhor. Marinho rendeu-se, juntou todas as forças que pôde, levantou as asas com grande esforço e, fechando os olhos, deslizou de cima do poste até o chão.

Ele caiu exatamente na serragem e ali permaneceu. Você nunca viu um pica-pau tão sujo. Estava coberto de serragem e nem se preocupou em sacudi-la de suas asas. Suas penas estavam como se ele tivesse acabado de sair de um vendaval; seu rosto molhado de lágrimas –  – na verdade ainda estava chorando — e até o bico estava decaido.

Marinho ficou contente por não haver muito tráfego na estrada naquele momento. Tinha alguma ideia de sua aparência horrível e sentia-se muito pior ainda, por isso não queria que ninguém o visse naquele estado. Sentia-se tão infeliz que não conseguiu fazer nada além de pôr sua cabeça embaixo da asa, tentando acreditar que estava escondido.

 E ali estava ele, na mesma posição e ânimo ou até pior, quando, meia hora mais tarde, ouviu um carro chegar, parar, uma porta abrir-se e vozes. Mesmo assim, não tirou a cabeça debaixo da asa. Então, o som de uma voz familiar fez seu coração quase parar de bater.

Vagarosamente, tirou à cabeça debaixo da asa e abriu os olhos. Ali, olhando para ele, estavam o homem da Companhia Telefônica e o Papai Pica-pau. Marinho entendeu imediatamente o que tinha acontecido. O homem da Companhia Telefônica tinha ficado tão zangado que fora diretamente ao escritório do Papai Pica-pau contar sobre o buraco que Marinho havia feito. E nada perturbava Papai Pica-pau tanto como ser interrompido em seu trabalho. Agora Marinho estava realmente em apuros.

— Bem, meu jovem, o que você tem a me dizer a seu favor? Papai Pica-pau olhou-o severamente, não mostrando a mínima compaixão pela sua desgraça.

Marinho engoliu e não disse nada. As lágrimas apareceram de novo em seus olhos.

— Você fez aquele buraco e este monte de serragem? Papai Pica-pau continuou impiedosamente.

Marinho engoliu de novo e inclinou a cabeça.

— Já não lhe disseram para não chegar perto dos postes de telefone?

Marinho inclinou a cabeça de novo e tentou enxugar os olhos com a asa.

— O que você pretende fazer a respeito disso?

— Eu não sei – Sussurrou Marinho.

— Você não sabe, repetiu Papai Pica-pau. Pode me dizer quem deveria saber se você mesmo não sabe?

Marinho parecia infeliz e não disse nada.

Papai Pica-pau virou-se para o homem da Companhia Telefônica e concluiu:

— Acho que ele pode começar a trabalhar imediatamente. Ainda é cedo e ele pode consertar este buraco antes de escurecer.

— Ótimo, disse o homem da Companhia Telefônica. A cola e os pedaços de madeira estão aqui no carro.

Os dois foram até o carro.

— Venha também Marinho, chamou Papai Pica-pau, olhando para trás por cima dos ombros.

— M-m-m mas, gaguejou Marinho.

— Venha, disse o pai num tom de voz muito sério. O homem da Companhia Telefônica vai lhe mostrar o que você deve fazer. Aí, ele e eu vamos voltar ao trabalho.

— Mas meu estômago está doendo – Lamentou-se Marinho.

Papai Pica-pau virou-se, pondo suas asas na cintura, dizendo:

— Marinho, tenho certeza de que não só seu estômago dói, mas também sua cabeça, seu bico, suas penas. Espero que também sua consciência esteja doendo. Tudo isso não faz a mínima diferença. Você deveria ter pensado nisso antes de desobedecer sua mãe. Não vou discutir mais sobre isso. Venha e não desperdice o nosso tempo.

Então, o pobre Marinho, fraco, doente e infeliz como estava, não teve outra escolha a não ser seguir, mancando, o pai e o homem da Companhia Telefônica. Queria saber como deveria consertar o poste — como podia alguém consertar um poste? Ele já tinha feito um buraco nele. E como poderia trabalhar no topo do poste? Estava tão atordoado que não podia sequer voar até lá, muito menos ficar lá em cima. Oh, por que, por que não ouvira sua mãe apenas uma vez?

Quando chegaram ao carro, o homem da Companhia Telefônica pegou pedacinhos de madeira e um vidro de “Cola”. Marinho nunca tinha visto cola antes e não tinha nem ideia para que servia. O homem mostrou-lhe como pôr cola em dois pedaços de madeira e segurá-los juntos até que estivessem grudados.

— É assim que você deve consertar o buraco no poste, ele disse. Encontre pedaços de madeira que se encaixem, cole-os e coloque no buraco. Se os pedaços não se encaixarem, você terá que moldá-los com o bico.

Tenho certeza de que você se sairá muito bem! Alguma pergunta?

Perguntar? Marinho tinha uma grande pergunta, que era: Como vou fazer isso? E outra pergunta era: Você não vai ficar para me ajudar? Mas não perguntou nada, apenas olhou para o chão, porque já sabia as respostas.

— Bem, já que não há perguntas, acho que podemos ir, disse Papai Pica-pau para o homem da Companhia Telefônica. Se você vai passar pelo meu escritório, eu gostaria que me desse uma carona.

— Com prazer – Disse o homem. Entre.

Papai Pica-pau começou a entrar no carro, mas voltou-se novamente para Marinho:

— Mais uma coisa: quando você acabar de fechar o buraco, limpe toda esta sujeira do chão. Não precisa sujar o mundo inteiro. Pegarei você aqui depois do trabalho e espero ver seu serviço terminado. E limpo.

Papai Pica-pau e o homem entraram no carro e saíram, deixando Marinho atrás deles, olhando-os tristemente. Então, ele olhou para a madeira, a cola, a serragem, depois para o topo do poste, e sentiu-se tonto novamente. Seu estômago doía ainda mais. Sentou-se e começou a chorar. Sentiu-se sozinho e triste, como se ninguém ligasse para o que aconteceu com ele. Nunca em sua vida estivera tão infeliz e sem esperança. Queria que sua mãe ou seus irmãos estivessem por perto. Eles seriam pelo menos compreensivos. Sabia que Petri faria tudo o que pudesse para ajudá-lo a consertar o buraco.

Mas ninguém veio e Marinho chorou por muito tempo. Finalmente, parou e olhou para cima de novo. O Sol já estava alto e ele sabia que era quase meio dia. Por isso, achou melhor começar o trabalho, ou nunca o terminaria.

Marinho colocou alguns pedaços de madeira no seu bico e voou para o alto do poste. Quer dizer, chegou até o alto do poste. Você certamente não chamaria todo aquele bater de asas e tumulto que ele fez, de um voo. Mas ele chegou lá e, atordoado como estava, só ficou o suficiente para colocar a madeira no buraco. Depois desceu para pegar a cola e subiu com ela.

Então, Marinho começou a trabalhar. Nenhum dos pedaços de madeira pareciam se encaixar e quando ele tentava cortar um pedaço no tamanho certo, ela rachava e não servia para mais nada. Quando conseguiu dois pedaços que se encaixavam e tentou colá-los, sujou as asas e até os pés de cola.

Ele sentiu-se péssimo. Mas estava contente por ter que trabalhar dentro do buraco, pelo menos no início, pois se estivesse na beirada, ficaria tão tonto e provavelmente cairia. Seu estômago doía. E sua garganta estava ressecada por causa do pó que ele estava levantando e da cola que se espalhara pelo buraco todo.

Marinho trabalhava e trabalhava e trabalhava. Mas, por mais que tentasse — e devo dizer que ele realmente tentou — parecia não estar fazendo nada além de tornar as coisas piores. O interior do buraco estava coberto por uma massa pegajosa de cola, serragem, pedacinhos de madeira quebrada e mais cola. Por duas vezes, os pés de Marinho ficaram tão presos na cola que levou um tempo enorme para tirá-los de lá.

O Sol descia cada vez mais no horizonte e estava chegando ao fim da tarde. Marinho tinha perdido a noção do tempo, mas sabia que não teria nada terminado quando seu pai voltasse, e logo novas lágrimas quentes se misturaram à cola que lhe cobria a face toda.

De repente, ouviu um barulho e sentiu que o poste vibrava um pouco. Virou-se e viu o homem da Companhia Telefônica e Papai Pica-pau, que tinham subido no poste e estavam olhando dentro do buraco, e Papai Pica-pau estava parado, na beirada do buraco, a seu lado.

— Bem, Marinho, vejo que você ainda não acabou – Disse o pai.

— Não, senhor, murmurou Marinho infeliz.

— Você começou bem? – Perguntou o pai.

— Não, senhor – Repetiu Marinho.

— Não, acho que não. Acho até que este buraco está pior do que quando você começou a restauração. E você também não parece nada bem, disse o pai, num tom mais carinhoso do que aquele que usara de manhã.

Ele voltou-se para o homem da Companhia Telefônica:

– Receio que meu filho não seja capaz de fazer este trabalho. Até agora ele não aprendeu muito sobre coisas construtivas — só coisas destrutivas. Penso que terei de lhe pagar pelo conserto.

Marinho ficou ouvindo o pai e o homem combinarem o preço do conserto e a melhor maneira de limpar toda aquela sujeira que ele tinha feito. Ele nunca havia se sentido tão arrasado e insignificante em toda a sua vida. O que seu pai tinha dito? Ele não aprendeu muito sobre coisas construtivas — só coisas destrutivas. Destrutivo! Isso é o que ele era e tinha sido o tempo todo.

Por que ele não tinha compreendido aquilo antes? Tudo o que fazia ultimamente parecia errado: ele era desobediente ou destrutivo!

Não é de se admirar que ele estivesse sempre em apuros. Pensou em Petri e como ela era construtiva, estava sempre pensando em fazer os outros felizes e em ser boa para todos. Ele gostaria de ser como ela, e de estar fora daquele buraco, de estar bem limpinho e sobretudo que seu pai não estivesse mais zangado. E desejou, mais que tudo, que tivesse ido jogar tênis de manhã com Chipe. Assim, não teria se metido naquela enroscada toda.

O pai e o homem terminaram a sua conversa. Então, Papai Pica-pau disse para Marinho:

— Tudo bem, filho, vamos. Eu vou levá-lo para tomar um banho no bebedouro de pássaros do jardim da Senhora Webster para ver se tiramos toda esta sujeira.

Sua mãe morreria de vergonha se visse você assim.

Marinho levantou-se e foi vagarosamente para o lado de seu pai e repentinamente virou-se para o homem da Companhia Telefônica e disse:

— Sinto muito por ter sido tão mal e por ter feito o buraco e não ter conseguido consertá-lo. Não sei quanto papai terá que pagar, mas eu vou pedir-lhe que tire da minha mesada. E prometo tentar não ser mais destrutivo.

O homem da Companhia Telefônica fez uma coisa surpreendente. Ele esticou a mão e apertou a asa de Marinho — melada de cola como estava.

— Está bem, filho. Sei o que é ser um garoto e meter-se em confusões. Tenho alguns meninos também. O mais importante é você aprender a lição — e acho que desta vez você aprendeu.

— Você tem um bom rapaz, Senhor Pica-pau, continuou virando-se para o pai de Marinho. Foi muito atencioso da parte dele pedir desculpas sem ter sido mandado e oferecer-se para pagar a despesa. Vou dizer o que eu gostaria de fazer, se o senhor e seu filho não se importarem. Em vez de fazê-lo pagar, eu gostaria que ele me ajudasse a consertar o buraco. Assim, ele aprenderá a fazer isso e eu terei a sua ajuda para trazer as coisas para cima e não precisarei ficar subindo e descendo a toda hora.

O pai olhou para Marinho e este viu uma nova luz em seu olhar — quase como se ele tivesse um pouco orgulhoso dele.

— O que você diz disso filho? – Perguntou.

— Eu gostaria de ajudar, disse Marinho. Gostaria de aprender como se conserta um buraco e, se eu não puder fazer nada mais, certamente poderei voar para cima e para baixo, carregando os pedaços de poste.

— Ótimo, então está combinado, disse o homem. Você começará amanhã?

— Claro – Disse Marinho.

— Muito obrigado, disse o pai, e ele e o homem da Companhia Telefônica deram-se as mãos.

— Vamos, Marinho. Há muito o que lavar em você antes de irmos para casa.

Marinho voava ao lado de seu pai e notou, para seu espanto, que estava voando muito mais estável do que antes, exceto, claro, por toda aquela cola em suas asas, que tornavam as coisas um pouco difíceis. Mas sentia-se mais leve por dentro e, que esquisito, seu estômago, cabeça e penas pararam de doer.

Quando chegaram ao banheiro dos pássaros, o pai de Marinho começou a esfregá-lo. Não era fácil, mas usando espiga de salgueiro como esponja e alguns cardos para remover o grosso da cola, ele conseguiu. Os cardos machucavam, mas isso não podia ser evitado. Quando terminaram, o pai ficou desesperado com a sujeira do bebedouro, mas sabia que o Senhor Webster o enchia todas as noites com água fresca da mangueira e no dia seguinte tudo estaria limpo. (Papai tinha certeza também que o Senhor Webster nunca entenderia como aquela cola toda tinha aparecido ali!)

Ao voar para casa, mesmo cansado e com fome, Marinho sentiu-se bem melhor do que vinha se sentindo há algum tempo. Ficou pensando no que disse o homem da Companhia Telefônica, que o chamou de ‘bom rapaz’. Até esse dia ninguém havia dito algo assim sobre ele, apenas coisas como: “Oh, que menino malcriado”!

— Papai, disse ele, de repente. Será que eu poderia ir às aulas de voo de verão, quando as férias começarem? Gostaria muito de poder voar em formação, naqueles voos de longa distância e acho que me sairei melhor se tiver outra oportunidade.

Papai Pica-pau olhou para Marinho um pouco surpreso e sorriu:

— Claro, Marinho. É uma ótima ideia. Mamãe e eu ficamos muito preocupados pensando em como você iria alcançar a sua classe no outono. Assim, acho que você conseguirá.

Quando estavam chegando perto de casa, Chipe voou na direção deles para encontrá-los.

— Você deveria ter ido com a gente, Marinho, ele disse. Tivemos um grande jogo.

— Da próxima vez eu tenho certeza de que irei com vocês, afirmou Marinho. Mas hoje eu tinha outra coisa para fazer: aprender a ser construtivo; e daqui para frente é o que vou ser.

Ao entrarem, Papai Pica-pau colocou sua asa afetuosamente sobre os ombros de Marinho:

— Bom rapaz! – Exclamou ele.

(Do Livro Histórias da Era Aquariana para Crianças – Vol. IV – Compiladas por um Estudante – Fraternidade Rosacruz)

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