O Desabrochar da Divindade Interna

PorFraternidade Rosacruz de Campinas

O Desabrochar da Divindade Interna

O Desabrochar da Divindade Interna

O ser humano possui o poder da divindade dentro de si. Cabe-lhe, e tão só a ele, perceber essa potencialidade e se tornar uma Inteligência Criadora — tornar-se, em suma, um deus.

Pare e pense por uns instantes o que isso realmente significa. Significa que, em algum momento do futuro distante, cada um de nós será tão onipotente quanto o Grande Ser ao qual chamamos de Deus; que realizaremos as façanhas a que se referiu Cristo “e maiores do que essas”; que viveremos permanentemente livres do peso de um corpo físico ou da obstrução da matéria; que, tendo aprendido as lições da evolução, conheceremos tanto o bem quanto o mal, ficaremos perfilados ao lado de Deus e nos tornaremos tão puros que o mal não terá possibilidade de nos atingir. Significa tudo isso, sem dúvida — mas está tão distante de nós, atualmente, que se torna imperscrutável.

Todavia, significa também que poderemos, apenas quando desejarmos tentá-lo exercer grande parte do potencial divino latente em cada um de nós, no presente momento. Não é necessário aguardarmos até o advento de uma era da evolução, dourada e remota. A maior parte das pessoas ficaria bastante surpreendida quanto ao grau de “divindade” que já no presente estágio do seu desenvolvimento está pronto para se manifestar.

Quais, então, seriam alguns desses atributos “divinos” a serem expandidos? Em primeiro lugar, estão os três que vêm talvez mais rapidamente à memória — a onisciência, a onipotência, a onipresença. Esses, sem dúvida, estão muito além de nosso alcance atual; por isso, para os fins deste artigo, podem deixar de ser levados em conta. Muito além de nós, inclusive, está a divina Força criadora que produz manifestações de grandeza tal como a dos corpos celestes.

Mas nós temos certo grau de força criativa dentro de nós, hoje, devendo ser exercida a fim de que, afinal, venha a conquistar o seu grande potencial.

Deveríamos aproveitar toda oportunidade para fazer desabrochar a Epigênese e utilizar a capacidade criadora que já possuímos, de forma que, pouco a pouco, ela pudesse aumentar. Um enfoque positivo e entusiasta em relação à vida, acompanhado pela determinação ativa de enfrentar os nossos problemas, de utilizar inteiramente quaisquer aptidões que tivermos e fazermos tudo o que pudermos para melhorar nossa situação e a de nossos companheiros é o contexto no qual a nossa capacidade criadora pode e deve ser desenvolvida. Convencer a nós mesmos de que não possamos fazer algo ou, alheios ao potencial que nos cabe desenvolver, que devamos deixar o “Zé” realizar as tarefas a serem cumpridas, enquanto nos dedicamos unicamente à busca do lazer e ócio, não nos aproximará sequer um pouco do objetivo final. Somente a contínua persistência, o trabalho árduo e a percepção refletida no que devamos fazer desabrochar nos levarão diretamente a esse objetivo.

Existe outro atributo divino, contudo, e ainda mais importante do que a capacidade criadora, que muitas pessoas, independentemente do estado de seus talentos ou aptidões, podem aprimorar no atual período de vida, com resultados compensadores — se apenas quiserem! Trata-se da qualidade relativa ao amor divino com suas características resultantes de compaixão e altruísmo. Novamente aqui, acontece que nenhum humano possa atualmente chegar ao ponto de conquistar a inescrutável profundidade, beleza, onipresença e força do Amor do nosso Pai Celestial ou do Cristo. Mas podemos, quase todos, desenvolver nossas naturezas amorosas e compassivas muito mais do que estamos fazendo.

Os requisitos necessários à realização disso não são os mesmos que proclamam ao mundo um material individual ou habilidade intelectual. Não serão as condições que tenham sido aperfeiçoadas durante anos de trabalho manual ou mental, em encarnações anteriores. São atributos espirituais, caso assim for desejado, e é garantido admitir-se que, em toda a humanidade — com exceção de pequena porcentagem —, eles não foram cultivados em grau considerável, em encarnações anteriores.

Esses predicados não podem ser aperfeiçoados, a menos que o indivíduo desenvolva um interesse autêntico em relação a outras pessoas e um desejo de começar a conhecê-las melhor. Isso não significa necessariamente “sociabilidade” no sentido comum da palavra, nem sequer espírito gregário. Significa o anseio de observar as pessoas e, após uma observação praticada de forma considerável, a capacidade de penetrar em suas características superficiais para chegar até o “homem interno”, discernindo suas verdadeiras naturezas. Em outras palavras, quer dizer a capacidade de procurar e achar a “divina Essência dentro de nós”.

Concomitantemente, deve desejar servir às pessoas que estiver se esforçando para conhecer tão bem. A percepção de que muitos dos problemas possam ser aliviados com uma espécie de assistência de camarada, ou que muitas pessoas, a despeito disso, tenham problemas tão irresistíveis que lhes pareçam insuperáveis, é o requisito para este desejo. Quanto mais estivermos conscientes dessa condição e pensarmos a seu respeito de modo positivo, tanto mais poderemos nos inculcar com a aspiração de ajudar a fazer algo. Não é suficiente o pensar vagamente, embora com a melhor das intenções, sobre os infortúnios de outrem, no contexto geral de “Não é isso terrível? Pobre criatura”, e em seguida volver os pensamentos a assuntos mais agradáveis. À reflexão “Isso não é terrível?” deve seguir o esforço determinado para pensar-se na situação e ver se podemos auxiliar. Não importa quão enorme seja o problema ou como possa parecer remota a solução. Do ponto de vista das nossas possibilidades, é sempre admissível prestar um amoroso apoio moral. Caso não pudermos fazer algo além disso, nossa presença compassiva e serena se mostrará, muito frequentemente, uma força sustentadora que ajudará a pessoa aflita a enfrentar o seu período de provas.

O desejo de ficar a serviço deveria ser, e pode, caso fosse perseguido sinceramente, expandir-se desde o círculo limitado de amigos e conhecidos pessoais até à área muito mais vasta da humanidade em geral. De fato, é bem mais fácil nos colocar inteiros e depositar a nossa completa simpatia no esforço fervoroso de ajudar um conhecido. Sentir a mesma dedicação pessoal no caso de, digamos, um grupo de pessoas sobre as quais a única coisa sabida é que sejam pobres, ou doentes, ou foram escravizadas, ou tenham sofrido uma calamidade ou qualquer outra coisa desse tipo, é mais difícil. É possível ainda, quando a compaixão relativa a seres próximos e prezados tenha sido cultivada, expandir esse sentimento para incluir em um rol de pessoas que necessitem de ajuda os que possam ser apenas “nomes” ou “estatísticas”.

A qualidade do Amor divino que estamos tentando emular inclui a capacidade de ser compassivo e amoroso com todos, não importando o quão desagradáveis, depravados ou abomináveis possam parecer. Incompreensível que possa ser essa ternura a muitos de nós, não é mais do que aquela que Deus e o Cristo exerceram sempre a favor de toda a raça humana. Quem de nós, não importa o quanto evoluído, iluminado e “bom” possa pensar que seja, pode afirmar positivamente que nunca, numa encarnação passada, tenha atingido um ponto de baixeza degradante?

Afirmamos que, em encarnações anteriores, quase toda a raça humana foi condenada por egoísmo e atos de depravação peremptoriamente repudiados, hoje, pelas pessoas de discernimento. Ademais, foi o Amor sublime de Deus e o incrível Amor redentor do Cristo que nos resgataram, e ainda resgatam, da deterioração evolutiva à qual nos encaminhamos em virtude da corrupção. Esse é o tipo de amor que nós, por nós mesmos, devemos adquirir.

Ademais, é importante relembrar que as próprias pessoas que pareçam “merecer” o nosso amor são as que menos o necessitam prementemente. Se existe algo que possa resgatar alguém do que pareça ser as últimas etapas da degenerescência, é a compaixão oferecida por um amigo, juntamente à simpatia e expressões de confiança que possam fazê-lo perceber a Centelha divina que está oculta por detrás do véu que sua natureza inferior confeccionou. Quando um indivíduo, finalmente, certificar-se de que haja, sem dúvida, “algo bom” em si e sua autoconfiança estiver um tanto solidificada, ele melhorará suas ações paulatinamente e fará com que a Centelha se incendeie cada vez mais brilhantemente. Porém, sem essa compreensão e ajuda compassiva proporcionadas por uma fonte externa que o fez olhar, pela primeira vez, para dentro de si com um olho perscrutador, teria tido dificuldade muito maior para dar o passo inicial na senda do “viver correto”.

Por último e, talvez, o mais importante, vem o predicado da espiritualidade. Ele também deve se desenvolver no contexto do serviço. Max Heindel deu-nos excelente orientação a tal respeito, no Livro Ensinamentos de um Iniciado, capítulo III.

“A ideia mais comumente aceita é que a espiritualidade se manifeste através da oração e da meditação; no entanto, se observarmos a vida de nosso Salvador, veremos que Ele não viveu na indolência. Não permaneceu em reclusão. Não se apartou do mundo e não se escondeu dele. Viveu entre o povo, ajudando-o em suas necessidades cotidianas. Ele o alimentou, quando isso foi necessário. Ele o curou sempre que teve oportunidade de fazê-lo e, inclusive, ministrou-lhe ensinamentos. Assim, foi Ele um servidor da humanidade, no verdadeiro sentido da palavra”.

Max Heindel nos diz, novamente: “Existem muitas pessoas que, aspirando aos poderes espirituais, percorrem de um centro, chamado de oculto, a outro, ingressam em mosteiros e apreciam locais de isolamento. Esperam, afastando-se do clamor e das atrações do mundo, cultivar sua natureza espiritual. Ficam expostos à luz da prece e meditação de manhã até à noite, enquanto o mundo se encontra gemendo em agonia. Então, passam a se admirar pelo fato de não progredirem, não sabendo por que não obtêm mais da senda da aspiração. Certamente, a oração e a meditação são necessárias; absolutamente essenciais ao crescimento anímico. Mas estaremos fadados a fracassar, caso dependamos, para o nosso crescimento anímico, de orações que são apenas palavras. A fim de obtermos resultados, deveremos viver de modo que toda a nossa vida se torne uma prece, uma aspiração. Como nos disse o filosofo Emerson:

Embora teus joelhos nunca tenham se dobrado,

Nos céus tuas orações de cada instante são sentidas,

E, sejam formadas para o bem ou para o mal,

Ainda são registradas e respondidas.

Não são as palavras que proferimos nos instantes de oração que contam; mas, com certeza, é a vida que eleva a prece…

“Há somente um meio de mostrarmos nossa fé e isso é feito pelas nossas obras; não importando em que setor da vida fomos colocados… O fator determinante que decide se um tipo de trabalho é espiritual ou material é a nossa atitude. A pessoa que estende os fios elétricos pode ser muito mais espiritualizada do que a que permanece sobre a plataforma.

Desobstruir um cano de esgoto é uma tarefa muito mais nobre do que viver falsamente atrás da dignidade de um cargo de professor, implicando uma espiritualidade que não existe realmente. Todo aquele que se esforça para cultivar essa rara qualidade espiritual deve começar, sempre, fazendo tudo pela maior glória do Senhor, porque quando fazemos todas as coisas pelo Senhor não importa que espécie de trabalho façamos. Escavando esgoto, inventando dispositivos que poupem trabalho, pregando sermões ou qualquer outra coisa, é tarefa espiritual, quando feita com amor a Deus e à humanidade”.

Vemos assim que o processo de desabrochamento da divindade existente dentro de nós depende do nosso conceito sobre as pessoas, nossas relações com elas e, o mais importante, nosso serviço a elas prestado. A nossa divindade nunca evoluirá no isolamento; embora seja verdade, sem dúvida, que quanto mais nos tornarmos adiantados espiritualmente, pareceremos estar, em certo sentido, mais isolados dos outros humanos, nossos companheiros.

Devemos aprender, todavia, a transcender esse isolamento dentro de nós próprios. De certo modo estaremos sozinhos. Ainda assim, a nossa compaixão cada vez mais abarcante em relação aos outros e a eterna consideração que lhes tivermos nos manterão bem ocupados, evitando que permaneçamos refletindo o fato de estarmos, talvez, não tão cercados de “amigos” como outrora.

Em outro sentido e muito mais significativo, entretanto, estaremos menos sós do que nunca, porque quanto mais desenvolvermos nossos atributos divinos, mais perto de Deus chegaremos e nos tornaremos uma parte mais ativa d’Ele, cada vez mais nos compenetrando da “unidade fundamental de cada um com tudo”. À medida que o Cristo interno nasce e Se desenvolve, sentiremos mais profundamente a bênção celestial se ampliando e nos apoiando em nossa jornada ascendente.

 

(Publicado na Revista Serviço Rosacruz de agosto de 1970)

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